O Espaço Cultural Luciano Bastos foi inaugurado em 12/08/11, tendo sido idealizado como forma de preservar o rico patrimônio cultural que constitui o prédio do antigo Colégio Rio Branco e todo acervo existente em seu interior, disponibilizando para a comunidade o acesso a esses bens, e estimulando a cultura local através do desenvolvimento de diversas atividades culturais. Praça Amaral Peixoto, 13, Centro, Bom Jesus do Itabapoana E-mail: espacoculturallucianobastos@gmail.com Tel: (22)3831-1056
sexta-feira, 22 de setembro de 2023
Estudantes participam de oficina na programação da “Primavera dos Museus”, do ECLB
Na biblioteca do ECLB, os participantes puderam conhecer sobre o grafismo e a pintura corporal indígena e seus significados, e ainda tiveram a oportunidade de praticar os desenhos, numa conscientização de que cada etnia possui uma identidade específica, que se reflete nos desenhos. Agradecemos também a participação na oficina da memorialista Maria Cristina Borges.
Além da Oficina, os participantes puderam também visitar a Exposição “Amazônia: do Presente e do Futuro”, que permanece no ECLB até o dia 29 de setembro.
As visitações ocorrem de terça a sexta-feira, das 9h às 11h30min e das 13h às 16h30min.
terça-feira, 19 de setembro de 2023
Grafismo indígena é tema de oficina da 17ª Primavera dos Museus no ECLB
Professoras de arte e artesãs tiveram a oportunidade de aprender um pouco sobre a cultura e costumes indígenas e a importância do grafismo para os povos indígenas.
A programação da 17ª Primavera dos Museus no Espaço Cultural Luciano Bastos segue até esta quinta-feira, 21, com Contação de histórias indígenas.
A exposição “Amazônia: do Presente e do Futuro” segue até o dia 29/09 no Espaço Cultural Luciano Bastos.
segunda-feira, 18 de setembro de 2023
17ª Primavera dos Museus inicia amanhã no Espaço Cultural Luciano Bastos
segunda-feira, 11 de setembro de 2023
Espaço Cultural Luciano Bastos integra a 17ª Primavera dos Museus
Contação de Histórias indígenas
A atividade trará histórias da cultura indígena, buscando promover o reconhecimento da cultura dos povos indígenas entre os participantes.
Público-alvo: estudantes do Ensino Fundamental.
Oficina de Grafismo indígena
Os participantes aprenderão a desenhar e pintar grafismos de diferentes etnias indígenas, reforçando a importância do respeito às diferentes culturas.
Público-alvo: interessados em geral.
Exposição “Amazônia: do Presente e do Futuro”
"História e memória, não só como historiador e fotógrafo, mas sim como 'parente', através das memórias de minha avó, todas vivenciadas no interior da Bahia, isso por volta de 1920, chegando em Bom Jesus por volta de 1974, trazida por meu pai, veio morar e tomar conta de mim. Desde então ela me contava suas histórias como indígena e como foi “tirada” de seu povo para ser doméstica já em Salvador: sua aldeia Pataxó, em Cabrália, Porto Seguro, foi invadida, e todos sem onde morar, foram para Salvador-BA.
Interessado em conhecer mais sobre sua história, seu povo, fui até Belém-PA, visitando e registrando aldeias, como as dos Tembés, do Rio Guará, no Pará, e em quase todo território do Amazonas, entre estradas de terra vermelha, rios e comunidades Quilombolas e Ribeirinhos, fiz um trabalho de pesquisa e registros fotográficos.
De minha ancestralidade e de onde veio metade de minha família, nasceu essa ideia de exposição audiovisual, entre fotos e sons da terra, entre livros, poesias indígenas e registros visuais."
sábado, 9 de setembro de 2023
HOSPITAL SÃO VICENTE DE PAULO E CAPELA NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO: UMA HISTÓRIA QUASE CENTENÁRIA EM BOM JESUS DO ITABAPOANA.
Capela Nossa Senhora do Rosário e Hospital São Vicente de Paulo. Foto: Paula Bastos, 2023. |
por Paula Aparecida Martins Borges Bastos
O Hospital São Vicente de Paulo (HSVP), com seus quase 100 anos de existência, a completar-se em 2025, localizado em área urbana central em Bom Jesus do Itabapoana, veio sofrendo transformações ao longo do tempo, promovendo alterações na paisagem, na medida em que seu porte foi se ampliando e sua estrutura hospitalar se tornando mais complexa e com maior capacidade de atendimento. Dessa estrutura, a chamada “parte antiga” do Hospital se destaca por guardar as memórias e vestígios de uma construção coletiva, que se mantém ao longo de gerações. Em especial, a Capela Nossa Senhora do Rosário e a fachada da “parte antiga” do Hospital, ajudam a contar um pouco da história do Vale do Itabapoana e, por que não dizer, da história regional, uma vez que a promoção da saúde realizada pelo Hospital sempre se mostrou receptiva e dedicada ao atendimento de pacientes de várias localidades, tornando-se progressivamente uma referência na região.
Os primórdios
Não há como dissociar a história do Hospital São Vicente de Paulo e a Capela de Nossa Senhora do Rosário de uma história regional e nacional, envolvendo os caminhos por que vem trilhando a saúde pública no país ao longo dos últimos séculos.
Até o século XIX, a região do Vale do Itabapoana se valeu, no cuidado com a saúde de seus habitantes, em grande parte de curandeiros(as) e benzedeiras(os), com seu amplo conhecimento sobre o uso de ervas e plantas medicinais nativas e suas propriedades sobre o corpo. O termo “puaia”, incorporado ao léxico da fala regional, ao longo de gerações e que perdura até os dias atuais é um aspecto que bem remete a essa memória (1)
Com o crescimento populacional na
região, a partir da segunda metade do século XIX, e a conformação de pequenos
lugarejos e vilas, a atuação de médicos e farmacêuticos começou a se fazer mais
presente, ainda que de forma tímida e localizada, de acordo com a moradia de
cada um desses profissionais.
Algumas epidemias, como a de varíola, de
forte impacto na região, atraíam a atenção de autoridades públicas, com o
envolvimento de médicos e assistentes (2), pois nessa época, “a noção de saúde
pública estava restrita ao combate às epidemias” (3).
No início
do século XX, mudanças começaram a ser implantadas pelo Estado em relação à
saúde e à assistência hospitalar no país, a partir da criação, em 1919, do
Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), sob a direção de Carlos Chagas
(4). Em um de seus discursos no Rio de Janeiro, ainda em 1918, o médico
sanitarista já defendia a ampliação de novos hospitais, não apenas na Capital
do país, uma vez que “no interior grassam endemias mortíferas, com ausência
absoluta de quaisquer medidas necessárias. Hospitais regionais, nas zonas de
endemias intensas, viriam atender a uma das indicações sanitárias e de
assistência pública mais urgentes em nossos sertões” (5).
É possível
perceber, assim, que a construção de um hospital em Bom Jesus do Itabapoana tende a convergir com um movimento que avança em nível nacional. Em maio de
1922, as obras parecem já estar em andamento, projetando-se um “pequeno
hospital, com duas enfermarias” (6). O recurso, provavelmente oriundo de
doações locais, parece não ser suficiente, sendo necessário recorrer ao apoio estatal,
e em dezembro de 1923, a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro autoriza
o Poder Executivo a auxiliar “com dez contos de reis (10:000$000) a ultimação
das obras do Hospital S. Vicente de Paulo, em Bom Jesus do Itabapoana, no
município de Itaperuna, abrindo-se para isso o necessário crédito” (7). Para
além do poder político regional, uma das leituras para essa aprovação é ter
sido o Hospital percebido como de interesse do Estado, no apoio à saúde da
população fluminense, o que possibilitou contar com dinheiro público para a
finalização de sua obra inaugural.
De caráter
filantrópico, o Hospital esteve, em sua concepção, construção e condução, sob o
encargo de uma instituição religiosa, a Conferência Vicentina de Bom Jesus,
presidida pelo médico Diogo Cabral de Mello, tendo por intuito atender “os
pobres que lhe estão confiados” (6). O movimento em torno da efetivação do
Hospital contou também com a importante colaboração da Superiora do Colégio
Sagrado Coração de Jesus (8), educandário que vinha funcionando, em Bom Jesus,
desde 1900 (9).
1925:
A inauguração
O ano de 1925 marca a inauguração do Hospital São Vicente de Paulo (HSVP). A cargo da Associação Vicentina, o HSVP era tratado na época como Santa Casa. A primeira equipe administrativa era composta do Presidente, Dr. Diogo Cabral de Mello; Vice-Presidente, João José Teixeira de Siqueira; secretário, Damião Teixeira de Siqueira; tesoureiro, Angenor Barroso (10).
Uma das imagens mais antigas do Hospital São Vicente de Paulo. Jornal O Norte Fluminense, 26/02/1995. |
Segundo jornais da época, os festejos da inauguração foram realizados em 06/01/1925 (8, 10). O administrador da Diocese, Monsenhor Henrique Mourão, embarcou especialmente para o evento, chegando ao meio dia em Bom Jesus, vindo de Campos. O início do ato se deu com uma “procissão formada de inúmeras pessoas de todas as classes”, conduzindo imagens dos santos que iriam ficar nas dependências da Santa Casa (8).
Após a benção do Monsenhor, formou-se
uma mesa para a solenidade. Fizeram uso da palavra os religiosos Padre Mello e
Monsenhor Mourão, os médicos Dr. Cabral de Mello, Presidente da Associação de
São Vicente, Dr Agenor de Barros, clínico local e o doutorando em medicina
Cesar Ferolla, além do advogado Octacilio de Aquino, não necessariamente
nessa ordem. Uma proposta de impressão dos discursos, com venda do livro para
melhoramentos da Santa Casa, foi feita por Padre Mello, porém não temos
conhecimento se tal obra chegou a ser publicada. O evento também contou com a
animação de uma orquestra, regida pelo maestro Leopoldo Muylaert (8).
Devido a dificuldades financeiras em manter as despesas rotineiras, o regular funcionamento do hospital parece ter se iniciado, efetivamente, apenas em 1927, quando o Hospital se encontrava completamente mobiliado e com “toda a roupa necessária”, sem dívidas e com recurso em caixa para as primeiras despesas (11).
Fachada atual da parte mais antiga do HSVP preserva aspectos originais da época de sua inauguração, em 1925. No lugar da antiga porta de entrada, agora existe uma janela. Foto: Paula Bastos, 2023. |
Janelas que guardam memórias da origem do HSVP. Foto: Paula Bastos, 2023. |
A numeração da rua Tenente José Teixeira foi modificada, permanecendo a lembrança do número antigo na fachada do HSVP. Atualmente, o Hospital corresponde ao nº 473. Foto: Paula Bastos, 202 |
O Hospital e a expectativa de emancipação política
A década de 1920 foi marcante no desenvolvimento de Bom Jesus do Itabapoana, quando um importante movimento de emancipação político-administrativa se organizava e fortalecia, de forma a construir as condições efetivas para deixar de ser um distrito de Itaperuna. Nesse contexto, era necessário criar os aparatos institucionais que poderiam ser considerados condição básica para a conformidade de um novo município. O hospital vinha, nesse sentido, fortalecer essas estruturas, encontrando-se pronto para inauguração já em fins de 1924.
O caminho trilhado nessa direção vinha se consolidando, com a nomeação do médico Dr.
Jeronimo Tavares, residente em Bom
Jesus, como deputado estadual. Foi ele um dos proponentes do projeto aprovado
pela Assembleia, de doação de recursos públicos ao Hospital, em 1923 (7). Nesse
momento, alinhado com o interesse da saúde pública, havia também um forte
movimento político em torno de sua liderança. Assassinado em dezembro de 1924,
Jeronimo Tavares não chegou a estar presente na inauguração do hospital, porém foi considerado,
em jornal da época, “um dos fundadores do Hospital de S. Vicente, de Bom Jesus
do Itabapoana e (que) pleiteava,
agora, a elevação dessa localidade à categoria de villa” (12). Sua morte foi um
grande baque na expectativa local em alcançar a emancipação, porém o Hospital continuou
se mostrando uma força a mais nessa direção. Assim apontou Octacílio de
Aquino, ao afirmar que “Retardam para outros dias a organização do Município
que Bom Jesus centralizasse. A consciência do seu direito, porém, não lhe
comprime a seiva do coração generoso. Funda um Hospital” (12). Na mesma direção
caminhou Cesar
Ferolla, futuro médico do HSVP: “é
com o maior e sincero prazer que vemos Bom Jesus dotado de mais uma das maiores
instituições que poderíamos imaginar” (10).
Em julho de 1927, o Presidente do Estado do Rio de Janeiro (título equivalente ao de Governador, atualmente), Feliciano Sodré, esteve em Bom Jesus para a inauguração da ponte de cimento sobre o rio Itabapoana, ligando os estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo. No dia do evento fez uma visita ao Hospital, que nessa época já se encontrava sob a Direção do Dr. Cesar Ferolla e contava com “um corpo de jovens médicos, do qual faz parte um filho do Sr. Ministro da Marinha” (14). Essa visita pode ser lida como uma demonstração do interesse e força política que cercavam a instituição.
A crise financeira das primeiras décadas
O Hospital São Vicente de Paulo, durante
a década de 1920, contava com grande parte de suas despesas sendo cobertas por doações, o que gerava continuamente uma instabilidade financeira. Em 1927, um
jornal local noticia que uma lei recentemente aprovada pelo Congresso Federal
aportava ao Hospital, anualmente, uma parte do imposto sobre bebidas alcóolicas
na Alfândega, o que pode ter sido o fator decisivo para a decisão de sua
abertura regular apenas nesse ano. A Câmara Municipal também havia aprovado uma
verba para o hospital, aguardando ainda sua efetivação (11).
Junto com a crise econômica de 1929, que
se alastrou por vários países no mundo, a crise do café, forte produto agrícola
da região, afetou também o Vale do Itabapoana na década de 1930. A situação
financeira do Hospital, dependendo basicamente de doações da sociedade, não
deixou de sentir seus reflexos. Aliado a tudo isso, um subsídio que era encaminhado pelo
Governo Federal ao HSVP também havia sido interrompido em 1930. Para tentar reverter
esse quadro, os diretores da Conferência Vicentina de Bom Jesus enviaram, em
1932, um apelo à esposa do Presidente Getúlio Vargas, Sra. Darcy Sarmanho
Vargas, para que o Governo Federal retornasse com o subsídio que era
encaminhado ao Hospital São Vicente de Paulo e que nos últimos dois anos havia
sido cortado (15). A necessidade de apoio financeiro dos Hospitais
filantrópicos parece ser generalizada, pois, meses depois, o Presidente da
República publica o Decreto n° 21.639, de 18/07/1932, concedendo auxílio a quase
cem instituições do país, grande parte delas voltada para o atendimento à saúde.
O Hospital São Vicente de Paulo foi uma das 13 instituições do Estado do Rio de
Janeiro a ser beneficiada, com o montante de 500$0 (16).
Criação
do Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus
O farmacêutico Aníbal Guimarães ficou incumbido de “organizar e modelar a sociedade; e em 2 de agosto foi fundado o Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus e eleita sua primeira diretoria, tendo ocupado os principais cargos Antônio Correia Escalda, Olívio Bastos e Felipe Luiz Maron indicados pelo Osório” (17).
Em 15 de novembro de 1936, o Estatuto do Centro foi aprovado em Assembleia. Este recebeu reformas posteriores em 1956, 1963, 1972, com seu artigo 1º indicando ser o Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus “uma sociedade civil de caráter filantrópico, assistencial, ação, divulgação e apolítica, tendo por finalidade trabalhar pelo progresso do Município de Bom Jesus do Itabapoana, e incentivar o desenvolvimento da região” (19).
Estatuto do Centro Popular, de 1936, com as reformas de 1956, 1963, 1972. Acervo Luciano Bastos |
Em 22 de novembro de 1936, ocorre, oficialmente, a transmissão do Hospital da Conferência Vicentina para o Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus, fazendo-se a assinatura do seguinte termo (20):
Aos vinte e dois dias do mês de novembro do ano de mil novecentos e trinta e seis, presentes a Diretoria da Conferência São Vicente de Paulo desta localidade, do Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus e pessoas gradas, especialmente convidadas, verificou-se a trasladação da posse do referido hospital da Conferência Vicentina ao Centro Popular, falando por ocasião da entrega o presidente daquela sociedade, Sr. João José Teixeira de Siqueira, que empossando a diretoria do Centro lhe fez entrega das chaves do próprio, fazendo votos para que o Centro, na sua meritória missão seja o mais feliz possível. Recebendo o referido hospital falou o Sr. Antônio Corrêa Escalda, presidente do Centro Popular, que encarecendo a realização dos Vicentinos, agradecia a todos o apoio que até agora tem sido prestado ao Centro, concluindo por declarar reaberto o Hospital São Vicente de Paulo, que aquela hora em diante era integrado à sua santa missão de minorar os sofrimentos do alheio. Nada mais havendo a tratar foi declarada encerrada esta sessão solene lavrando-se a presente ata que vai pelas duas diretorias assinadas e por todas as pessoas presentes a tal acontecimento. Bom Jesus do Itabapoana, 22 de novembro de 1936.
Passa assim, o Hospital, a tornar a abrir suas portas em atendimento aos doentes, em especial aos indigentes (20). Para garantir recursos ao Centro Popular, o “Presidente Antônio Corrêa Escalda, grande exportador de café, instituiu a taxa de um tostão (100 réis) sobre a saca do produto exportado e de um vintém (20 réis) sobre todas as importações pelo comércio em geral e foi esse tostão e esse vintém juntos que custearam as despesas fundamentais do Centro Pró-Melhoramentos de Bom Jesus” (17).
Jornal O Norte Fluminense, 09/08/2006. Acervo: ECLB. |
Em pouco mais de um ano após a posse do Centro Popular, em 03/03/1938, um novo pavilhão foi inaugurado, havendo na programação a celebração de missa no Hospital, discursos e visita às novas construções, contando também com a banda de música local, sob a regência do maestro Ramon Rodrigues. Dentre os presentes, estiveram o representante do Diretor da Saúde Pública do Estado, o representante do prefeito de Campos, o prefeito do município de Itaperuna e o representante do prefeito de Calçado (21), o que dá uma dimensão da abrangência do atendimento hospitalar à época. Recordemos que nesse período está próximo de se concretizar o sonho da emancipação, e essa inauguração pode ser lida tanto como um reforço ao movimento em andamento, tanto como uma demonstração afirmativa do poder e organização local. A presença de representantes de municípios vizinhos demonstra o peso político de que o ato em questão se revestia.
Bom Jesus do Itabapoana finalmente consegue sua definitiva autonomia, através do Decreto nº 633, de 14/11/1938, ocorrendo a instalação do Município em 1º de janeiro de 1939. Dois fatos significativos também irão marcar o ano de 1939 para o Hospital São Vicente de Paulo. O primeiro deles se dá em 28/08/1939, quando as Irmãs de Caridade da Congregação de Jesus Cristo Rei passam a assumir “a direção interna e o serviço de enfermagem” (22). Durante muitos anos, a atuação das Irmãs de Caridade será o esteio na atenção e cuidado da saúde dos pacientes atendidos pelo Hospital.
Irmãs de Caridade da Congregação de Jesus Cristo Rei atuaram ativamente no Hospital São Vicente de Paulo por muitos anos, tanto na enfermagem quanto na direção interna. Acervo Luciano Bastos. |
O segundo fato se dá em 08/11/1939, quando o Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus passa a ser considerado de utilidade pública, em virtude dos relevantes serviços prestados, dentre os quais, na condução do Hospital São Vicente de Paulo. O ato se deu através do Decreto Executivo nº 1, assinado pelo prefeito José de Oliveira Borges.
Decreto Municipal nº 1, de 1939. Acervo Luciano Bastos |
Eventos
beneficentes, dinâmicas da sociedade e apoio financeiro ao Hospital
O primeiro diretor do HSVP, Dr. Cabral,
perspicaz quanto à necessidade de garantir apoio amplo da sociedade com doações
para a manutenção da instituição filantrópica, em seu discurso durante a
inauguração do Hospital, em 1925, pede “para a Santa Casa o amparo das senhoras
e senhorinhas” (8). Garantir o envolvimento feminino nessa causa era,
certamente, contar com um conjunto de pessoas que poderiam ser decisivas na
arrecadação financeira para o Hospital, seja na promoção de eventos
beneficentes, seja na influência ou atuação direta sobre o destino do recurso
familiar em doações ao hospital.
Em 1927, a Diretoria do Hospital
promoveu ativamente convite para a inscrição de sócios efetivos que fizessem
uma contribuição mensal, além de solicitar donativos como roupas, mantimentos,
entre outros (11).
Para manter em funcionamento a
instituição, além de contar com donativos de pessoas abastadas da região, a
diretoria do Hospital passou também a promover e estimular a organização de
eventos beneficentes. Os eventos começaram simples, como simples era a vida
urbana em Bom Jesus do Itabapoana na década de 1920. Um deles teria ocorrido no
Cine Bom Jesus, em 1928, com um festival de arte, que contou com declamações e
outras atividades literárias (23).
Com o passar dos anos, a emancipação
política e as melhorias urbanas, além do incremento de classes economicamente
favorecidas e a ampliação de serviços e comércios na cidade, deu-se uma
prosperidade que possibilitou novos formatos de eventos beneficentes. Os
bailes, muito populares naquela época, passaram a ser uma excelente forma de
angariar recursos, por atraírem um público amante da música e da dança. Além disso,
muitos se tornavam um verdadeiro evento social, com determinados grupos sociais
se empenhando em participar como forma de distinção.
Um desses bailes, promovido pelo Centro
Popular Pro-Melhoramentos de Bom Jesus em benefício do Hospital, ocorreu no salão
do Sr. Salim Elias, situado na Praça Governador Portela, em julho de 1945.
Convite a Luciano Bastos para evento beneficente em prol do HSVP. Nessa época, o patrono de nosso Espaço Cultural contava com 17 anos. Acervo Luciano Bastos |
A partir de 1947, o Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus passou a promover, anualmente, a campanha da “Rainha da Festa de Agosto”, que depois passou a ser chamada de “Rainha da Primavera”.
Os recursos obtidos na Campanha eram direcionados ao Hospital São Vicente de Paulo e essa Festa se manteve por muitos anos, conseguindo apoiar diversas melhorias no Hospital. Consistindo o número de votos de cada candidata a um valor equivalente em dinheiro, o concurso mobilizava as jovens concorrentes, seus familiares, amigos e admiradores. Além disso, eventos festivos eram promovidos durante todo o período da campanha, em especial na contagem dos votos e no grande baile da Coroação da Rainha. O nome de pessoas abastadas apoiadoras de cada jovem participante muitas vezes era divulgado nos jornais como forma de distinção e também incentivo a que outros doadores se manifestassem (25, 26, 27).
Jornal O Norte Fluminense, 22/09/1957 Jornal O Norte Fluminense, 06/10/1957 |
Essas ações, além do caráter festivo e simbólico no envolvimento das pessoas em torno à causa institucional, se configuravam importantes para o HSVP, pois, como instituição filantrópica, estava continuamente a necessitar de doações de particulares para funcionar com qualidade e conseguir incrementar melhorias.
Os
jornais: aliados da causa
Os jornais locais funcionaram, no século XX, como grandes aliados no estímulo à mobilização social em prol do Hospital São Vicente de Paulo. Em 1927, “O Liberal”, no sentido de estimular doações, afirmava “Estamos certos também que as nobres famílias bonjesuenses lembrarão sempre de oferecer ao hospital roupas, mantimentos, etc., tratando-se de uma instituição pobre” (11). Cabe destacar, também, que os envolvidos na publicação dos jornais eram, muitas vezes, os mesmos envolvidos com as atividades de apoio ao Hospital.
Doadores
Uma das estratégias usadas por seus mantenedores, iniciada nos tempos da Conferência Vicentina, e que se prolongou por décadas, já sob a direção do Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus, era a divulgação do nome de seus benfeitores nos jornais locais, muitas vezes constando inclusive o valor da doação. Dessa forma, o doador se dignificava perante a sociedade, como pessoa altruísta e benemérita, ganhando o reconhecimento de seus pares.
Em 1932, o Jornal “O Momento” publicou
longa matéria com uma entrevista ao Sr. Sinhozinho Teixeira, Provedor do
Hospital. Sobre o pagamento da mensalidade dos contribuintes, afirmava o
Provedor que nem todos estavam em dia, mas ressaltava que, entre muitos que faziam
doação espontânea, estava “o sr. Altivo Casemiro de Campos, que além do portão
e de muitos outros donativos, mandou ainda aumentar a sua mensalidade de 5$000
para 10$000, o que prova a boa vontade que nutre aquele conceituado cavalheiro
para com a nossa casa de caridade”. Outros também auxiliavam, como o sr.
Alexandre José Assad, que ofertou seis cobertores. D. Francisca Soares, por sua
vez “é uma alma nobre, também não se esquece do nosso Hospital. Não tem conta
os favores que a distinta senhora tem prestado ao nosso humilde
estabelecimento”, e seguia nominando mais benfeitores (27).
Além disso, havia o estímulo a que
outros trilhassem o mesmo caminho, conseguindo, assim, ter seus nomes estampados nos jornais. Essa é a tática, por exemplo, explicitamente
indicada em “A Voz do Povo”, em 1940, quando indicava que “Daremos nesta folha,
a relação das pessoas que atenderem o apelo das Irmãs”. O apelo em questão era
das Irmãs que conduziam o Hospital, solicitando doação de material para a
Capela Nossa Senhora do Rosário (28).
Pacientes
Quem tinha seus nomes gravados nos jornais da época, também, eram os pacientes. Apesar de não ocorrer em grande maioria, a menção a alguns pacientes internados em quarto particular foi detectada, podendo ser interpretada como uma forma de publicidade social e prestígio para o Hospital.
Em 1932, Octávio Gonçalves Neves, 30
anos, branco, casado, colono do sr. Joaquim Dutra de Moraes, dos Quebrados,
estava em um leito particular após ter sido
operado às pressas, por ter chegado ao Hospital em estado “lastimável”,
com uma hérnia estrangulada. A cirurgia, realizada pelo “dr. Abelardo e seu
competente auxiliar”, constou de anestesia geral (clorofórmio) com operação
feita pelo “processo de Bassini” (29).
Em 1958, a notícia foi de um paciente
com vesícula supurada, que necessitou passar por delicadas cirurgias, estando
em um dos quartos particulares. Seu nome e o dos médicos que o atenderam foram
publicados, além de indicar estar o paciente recebendo diariamente muitas
visitas dos amigos (30). Ao noticiar que determinadas pessoas conhecidas do
grupo social com maior poder aquisitivo da sociedade confiavam sua saúde ao
HSVP, estavam passando um recado a seus pares de que ali havia condições
adequadas para tratamento.
A grande maioria dos citados nos jornais, porém, era de pacientes que recebiam assistência gratuita. Em alguns casos, havia inclusive a indicação do nome, seguido de breve descrição e situação de cada internado no hospital (29, 30, 31). Essas matérias podem ser interpretadas como uma prestação de contas aos benfeitores e à sociedade em geral, demonstrando o bom uso do recurso no atendimento aos necessitados e a importância da manutenção da Instituição.
(...) o hospital está aí, ergue-se majestoso, na grandiosidade e orgulho de si mesmo; coesos, havemos de sustenta-lo, seja com o modesto auxilio de cada um, seja com o serviço gratuito dos facultativos.
Décadas depois, em 1958, o Hospital ainda era local onde desassistidos e pessoas sem família eram acolhidas. Esse é o caso, por exemplo, do Sr. Alfredo Avelar, branco, 68 anos, considerado “atoleimado”, sem morada certa, internado há vários meses no hospital e abandonado pelos três filhos. Outro caso é o da Sra. Emilia Mathias de Araujo, “preta, 72 anos", solteira, “encostada” no Hospital havia 11 anos (30).
Capela
Nossa Senhora do Rosário
Interior da Capela Nossa Senhora do Rosário, com uma das Irmãs de Caridade do Hospital no cuidado com as imagens. Fonte: Acervo Ricardo Teixeira - Facebook. |
A relação entre Hospital e instituição religiosa, no Brasil, foi instituída desde os tempos da Colônia, e durou até o século XX. Esse estreito relacionamento entre assistência à saúde e filantropia explica, assim, a existência de grande número de hospitais que possuem capelas, e “o predomínio de igrejinhas católicas nos complexos hospitalares do país” (33). Nesse contexto se insere a Capela de Nossa Senhora do Rosário, construída em virtude da estreita relação de religiosos católicos envolvidos na condução do HSVP, de fins filantrópicos, em suas primeiras décadas de existência.
Muito provavelmente a função de capela teria funcionado em instalações simples, dentro do Hospital, uma vez que para ali foram as imagens levadas em Procissão no ato de sua inauguração, em 1925 (9). Contribuiu para isso, provavelmente, o fato de que na época das obras do Hospital, o Padre Mello, pároco local, estava fortemente mobilizado para a construção de uma das torres da Matriz, não conseguindo se envolver em angariar recursos para outra finalidade (8).
Essa situação parece ter perdurado ao longo dos próximos anos, pois durante a inauguração de novas dependências do HSVP, em 1938, “às 8 horas da manhã foi celebrada missa no Hospital, assistida por elementos de destaque em nosso meio” (21). Dois anos depois, em 1940, o jornal “A Voz do Povo” (28) publica a seguinte nota sobre a Capela do HSVP:
Lacuna de há muito notada em nosso Hospital vem de ser agora sanada, com o início da construção de sua capela, cuja pedra fundamental, como é do conhecimento de todos, foi lançada solenemente no dia consagrado ao santo padroeiro daquela casa de caridade.
Dentre os donativos, eram esperados “tijolos, telhas, cal, cimento, ladrilhos, madeira". Tudo leva a crer que muito rapidamente se concretizou a obra, de forma que podemos estimar que a Capela como a conhecemos hoje, provavelmente data dos primeiros anos da década de 1940.
Capela Nossa Senhora do Rosário e Hospital São Vicente de Paulo, vendo-se também as Irmãs de Caridade na frente da entrada do Hospital. Acervo: ECLB. |
Apesar de atualmente as dependências estarem separadas, com a Capela estando sob os cuidados da Congregação Vicentina, Capela e Hospital têm sido considerados, pelos moradores, como um conjunto, não sendo raro menção à "Capela anexa ao Hospital" ou mesmo "Capela São Vicente de Paulo".
Arquitetura e instalações
O hospital “é um espaço que foi evoluindo ao longo dos séculos, aliando suas diversas funções ao conceito arquitetônico próprio de cada época, fazendo parte de nosso patrimônio cultural, mas ainda hoje pouco enfatizado na sua contextualização” (34). Assim ocorre com o Hospital São Vicente de Paulo, um patrimônio cultural com quase cem anos de existência, que vem sofrendo diversas modificações ao longo do tempo.
Na década de 1920, o HSVP estava
composto “de dois salões com 15 leitos destinados a doentes pobres; diversos
quartos particulares, ótimas instalações sanitárias, serviço de cozinha, sala
de operações com mesa e aparelhamento dos mais modernos e anexo um pavilhão
destinado ao isolamento de doentes que o necessitarem” (10). A partir de
fotografias antigas do Hospital, é possível pressupor que sua construção tenha
se baseado nas orientações gerais comuns para os Hospitais da época, dentre as
quais a conformação de pavilhões paralelos e separados por pátios com jardins
(35).
Uma descrição do Hospital, em 1928,
auxilia na compreensão de sua disposição interna: “logo à entrada, encontra-se
a ‘sala de visitas’ que tem comunicação com o compartimento destinado às
consultas (...), seguindo-se-lhes os quartos particulares muito espaçosos”. Há
também duas enfermarias (uma para os homens e outra para as mulheres), uma sala
de operações, sala dos curativos, sala de esterilização, “com um ótimo
autoclave de Chamberlein” e outras dependências. O quarto para isolamento de
pessoas com doenças contagiosas encontrava-se em um pavilhão, ao fundo do
Hospital, onde havia também uma sala do necrotério (36).
Em 1932, o Provedor do Hospital São Vicente de Paulo, Sr. Sinhozinho Teixeira, informava ter havido, recentemente, a construção de um muro e pretender instalar futuramente, “na entrada, um bem cuidado jardim”, além de “um calçamento na entrada do edifício” (27). Nenhuma obra de porte estava prevista, e possivelmente isso se devia às instabilidades financeiras que rondavam a instituição.
Hospital São Vicente de Paulo. O "bem cuidado jardim" e "calçamento na entrada do edifício", previstos em 1932 para realização futura, parece já terem sido realizados. Acervo: ECLB. |
É também em 1939 que ocorre a finalização dos apartamentos para as Irmãs de Caridade, que nesse ano começaram a trabalhar no Hospital. A obra teria sido feita com recursos doados pelo Coronel João Ferreira Soares (22).
Em fins de 1939, há notícia de que o Hospital tem 26 leitos disponíveis para indigentes (38). Em 1950, esse número parece não ter sofrido alteração, pois uma matéria de jornal indica que “os leitos disponíveis, para indigentes, em nosso hospital, continuam os mesmos, desde que foi reaberto, advindo daí a deficiência que se nota nesse setor” (39).
Em 1951, uma nova Clausura para as irmãs que atuavam no Hospital foi inaugurada no mês de maio, situada no terceiro pavimento do edifício da Maternidade do HSVP. Para a solenidade, o Centro Popular, sob a direção do Dr. Oliveiro Teixeira, convidou “todas as autoridades de Bom Jesus e a sociedade em geral” (40).
Em 1957 teriam sido realizadas a construção do salão
de recepção e a remodelação da frente do Hospital (24).
Em 1958, a enfermaria dos homens contava
com 18 leitos e a das mulheres 17, além da maternidade e infantil. Possuía
quatro quartos particulares e seis apartamentos dotados de todas as instalações
sanitárias, estando um deles ocupado pela Enfermeira Chefe do Hospital, Srta.
Alides Pinto (30). Seriam esses apartamentos os ocupados anteriormente pelas Irmãs de Caridade?
Em 1959, o Hospital contava “com 63
leitos, sendo 53 gerais, 4 de cirurgia, 6 de obstetrícia e ginecologia, 1 de
ortopedia e traumatologia”. Nessa época, o Centro Pró-Melhoramentos de Bom
Jesus, buscando garantir a autossuficiência financeira, tinha por projeto “a
ampliação do Hospital com a construção de um novo pavilhão, com 18 leitos, que
serão destinados a pensionistas e que proporcionarão a renda necessária para
auxiliar a manutenção dos serviços gratuitos mantidos pelo nosocômio” (24).
É possível observar, assim, que o HSVP veio constantemente ampliando suas instalações ao longo de suas primeiras décadas de existência. Nesse período, mudanças também ocorreram em nível nacional. Em 1930, Getúlio Vargas instituiu o Departamento Nacional de Saúde, dentro do Ministério da Educação e Saúde. E em 25/07/1953, ocorreu o desmembramento, com a criação do Ministério da Saúde através da Lei n° 1.920 (41, 42).
As últimas décadas do século XX Na segunda metade do século XX, o HSVP continuou atendendo a população, sempre sob a condução do
Centro Popular Pro-Melhoramentos de Bom Jesus, contando com verbas públicas,
atendimentos privados e também doações.
Como instituição filantrópica que é,
observaremos que, ao longo do tempo, o Hospital apresenta momentos de
forte expansão e outros de difíceis crises. As diferentes conjunturas em que
tais processos se desenvolvem ao longo do tempo fazem com que diferentes
aspectos devam ser abordados na tentativa de explicar tais eventos. O que é
certo, porém, é que a comunidade de Bom Jesus sempre percebeu a importância de
se garantir um efetivo funcionamento do Hospital, se orgulhando a cada
conquista que a área da Saúde faz no sentido da melhoria, ampliação das
especialidades e universalização de atendimentos.
A universalização, aliás, é um dos
grandes marcos na área de saúde do Brasil e que terá reflexo também no HSVP. Antes
de 1988, quando foi promulgada a Constituição Federal que instituiu o Sistema
Único de Saúde (SUS), “o sistema público de saúde prestava assistência apenas
aos trabalhadores vinculados à previdência social e aproximadamente 30 milhões
de pessoas tinham acesso aos serviços hospitalares, cabendo às entidades
filantrópicas o atendimento aos demais cidadãos” (42).
Em 1989, o HSVP “transformou-se num
nosocômio modelo, daí a demanda sempre crescente por parte dos que necessitam
de socorros médicos e hospitalares, atraindo doentes de todo o Vale do
Itabapoana, municípios do Sul Capixaba e distritos de Campos”. Nessa época o
Hospital já possuía condições de atendimentos mais complexos, inclusive com
funcionamento de UTI, que aguardava o credenciamento junto ao INAMPS (43).
Essa ampliação de pessoas atendidas pelo HSVP, muitas delas vindas de outros municípios, se confirma na pesquisa realizada por Andrade, em 2005. Quando comparou os dados de atendimento de 1970 e 1999, percebeu que nos dois anos comparativos, o número de pacientes saltou de 1.502 para 4.256, ampliando o atendimento para além da micro região e também expandindo para pessoas da região sul capixaba (44).
Andrade recorda que a história inicial do Hospital São Vicente de Paulo "confunde-se com os primeiros movimentos da sociedade civil do município na campanha para a reabertura daquele estabelecimento". E agrega: "Ao longo do tempo, o Centro Pró Melhoramento veio confirmar o empenho da diretoria em melhorar o hospital, tanto em termos de compra de equipamentos como em expansão física, esmerando-se para acompanhar os mais modernos avanços da medicina" (44).
O Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus, em seus quase 90 anos de existência, teve em sua diretoria a participação de diversas pessoas da comunidade, de variadas classes e profissões, todas com a função de se dedicar ao bem comum. Luciano Augusto Bastos, patrono de nosso Espaço Cultural, atuou como Presidente do Centro Popular Bom Jesus nos biênios 1993/1994 e 1995/1996, nesse último realizando a comemoração dos 70 anos de existência do Hospital São Vicente de Paulo.
Jornal O Norte Fluminense, 07/03/1993 |
Luciano Bastos informa aos colaboradores do Centro Popular sobre sua Presidência no biênio 1993/1994. Acervo Luciano Bastos. |
Jornal BJ-Notícias, 15 a 28/02/1995 |
Jornal O Norte Fluminense, 26/02/1995. Nos jornais de 1925 pesquisados, os festejos da inauguração estão indicados como tendo ocorrido no dia 06 de janeiro daquele ano. |
O século XXI: passado, presente e futuro
A Capela Nossa Senhora do Rosário, com sua singela e permanente presença ao lado da “fachada antiga” do Hospital, compõe com este um conjunto da paisagem que remete à história urbana de Bom Jesus do Itabapoana. Sua edificação, aparentemente sem alterações significativas ao longo do tempo, é um testemunho singular da arquitetura local das primeiras décadas do século XX, constituindo uma das mais antigas capelas da área urbana da sede. Sob a condução da Conferência Vicentina, ao longo de todas essas décadas de existência, missas e outros eventos religiosos têm ocorrido no local. Em 2018, um ato realizado no interior da Capela Nossa Senhora do Rosário, fez uma homenagem aos seus 93 anos existência, com presença de representantes da Congregação Vicentina (45, 46).
Interior da Capela Nossa Senhora do Rosário. 2018. Fonte: Blog Jornal O Norte Fluminense, 2018. |
Capela Nossa Senhora do Rosário. 2018. Fonte: Blog Jornal O Norte Fluminense, 2018. |
Anúncio de Missa na Capela Nossa Senhora do Rosário. 2022. Fonte: Paróquia Senhor Bom Jesus - Facebook, 26/12/2022 |
Quanto ao Hospital São Vicente de Paulo, mesmo com todas as alterações e expansões ocorridas ao longo do tempo, a chamada “fachada antiga”, aquela que atesta sua arquitetura de fundação e primeiros anos de funcionamento, continua preservada até os tempos atuais. Situada na Rua Tenente José Teixeira, entre a Capela e a atual entrada do Hospital, essa fachada constitui um importante testemunho histórico de nosso século XX.
Fachada Antiga do Hospital São Vicente de Paulo. As cores
verdes predominam, com jardim e iluminação noturna de destaque, em 2013. Foto: HSVP - Facebook, 2013 |
O conjunto arquitetônico composto pela "fachada antiga" do Hospital e da Capela guardam as marcas do estilo eclético, movimento arquitetônico importante do século XIX e que durou até o início do século XX (47). Veja mais detalhes aqui
Conjunto arquitetônico na Rua Tenente José Teixeira: Capela e fachada antiga do Hospital preservam memórias e histórias do Vale do Itabapoana no século XX. Foto: Paula Bastos, 2023. |
Em um importante e detalhado estudo sobre as recentes alterações do HSVP e seu efeito sobre o entorno, Lettieri e Rego destacam o crescimento do Hospital na capacidade de atendimento à população regional, aliado às melhorias na infraestrutura. Ressaltam, porém, que como todo edifício urbano, os hospitais devem pensar não apenas em seu interior, mas também em sua relação com o espaço externo, ou seja, o pedestre, o transeunte, o morador da cidade. As autoras ressaltam que “é válido reforçar a ambiguidade do grande potencial transformador do hospital, que podendo impactar a paisagem na qual se insere de maneiras positivas e/ou negativas, pode acrescentar ou subtrair valor, afetivo e econômico, ao seu entorno” (48). Por isso a importância de se pensar a calçada, os espaços verdes de sombra, os locais de deslocamento do pedestre, o entorno e a paisagem.
Capela e fachada antiga do HSVP: visão atual. Iluminação noturna do Hospital continua, porém sem jardim. Foto: Paula Bastos, 2023. |
Além disso, tendo em vista as alterações em contínuo por que vem passando o Hospital, é importante destacar que sua fachada da "parte antiga", juntamente com a Capela Nossa Senhora do Rosário, na rua Tenente José Teixeira, constituem um registro cultural que remete à história e memória de Bom Jesus do Itabapoana e suas edificações da primeira metade do século XX. É dever da geração atual garantir que a permanência desse conjunto arquitetônico se mantenha como direito à memória para as gerações futuras, pois como afirma Sanglar, "O hospital informa sobre a sociedade na qual ele está inserido. É um microcosmo da sociedade" (4).
***
Agradeço à minha irmã, Claudia Bastos do Carmo, pelo apoio na pesquisa bibliográfica.
É permitida a reprodução do conteúdo deste blog em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, desde que citada a fonte e o autor.
Referências
Para saber mais sobre o tema: BASTOS, P.A.M.B. Lenda ou registro popular? O Norte Fluminense, 10/06/2011; TUPINI, M.T.; VARGAS, E.F.M. Da planta para a língua: uma análise das representações sociais sobre a puaia em Bom Jesus do Itabapoana. Cadernos do CNLF, v. XIX, n.12, 2015. Disponível em: http://www.filologia.org.br/xix_cnlf/cnlf/12/007.pdf Acesso 03/09/2023. Também é possível ver alguns exemplos de seu uso na língua no vídeo a seguir: https://www.instagram.com/p/ClHmBaUPW7r/
(2)
Notícias sobre uma epidemia de varíola na região, na década de 1870, podem ser
conferidas em: BASTOS, C.M.B. Padre João Mendes Ribeiro à luz de documentos
históricos. Disponível em: http://espacoculturallucianobastos.blogspot.com/2020/11/padre-joao-mendes-ribeiro-luz-de.html Acesso 27/08/2023
(6) A União, Rio de Janeiro, Ano XIII, n. 37, 07/05/1922.
(7) O Fluminense, Niterói, Ano 46, n. 12.482, p.1, 21/12/1923.
(8) A Cidade, Bom Jesus do Itabapoana, Ano 1, n. 2, 08/01/1925.
(9) Monitor Campista, Campos dos Goytacazes, Ano 64, n. 197, 28/08/1900.
(10) Nossa Terra, Bom Jesus do Itabapoana, Ano 2, nº 3, 06/01/1925.
(11) O Liberal, Bom Jesus do Itabapoana, Ano 1, n. 15, 13/03/1927.
(12) A Noite, Rio de Janeiro, Ano XIV, n. 4.696, 19/12/1924
(13) A Cidade, Bom Jesus do Itabapoana, Ano 1, n. 1, 01/01/1925,.
(14) O Paiz, Rio de Janeiro, Ano XLIII, n.15.613, 20/07/1927.
(15) O Momento, Bom Jesus do Itabapoana, n. 13, 30/04/1932.
(16) Decreto nº 21.639, de 18 de Julho de 1932. Concede auxílios a instituições, em diversos Estados. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-21639-18-julho-1932-498843-publicacaooriginal-1-pe.html Acesso: 25/08/2023.
(17) DUTRA, A. Páginas Memoráveis de Bom Jesus do Itabapoana. Editadas por Delton de Mattos. Textus, Rio de Janeiro, 2004.
(18) O Norte Fluminense, Bom Jesus do Itabapoana, 07/10/1984. Na primeira reunião estiveram presentes 34 participantes.
(19) Estatutos. Centro Popular Pró-Melhoramentos de Bom Jesus, 1972.
(20) O Norte Fluminense, Bom Jesus do Itabapoana, 18/11/1984. Nesse evento estiveram presentes mais de 50 pessoas.
(21) A Voz do Povo, Bom Jesus do Itabapoana, Ano V, n.221, 05/03/1938.
(22) O Norte Fluminense, Bom Jesus do Itabapoana, 09/08/2006.
(23) Bom Jesus-Jornal, Bom Jesus do Itabapoana, ano 1, n. 6, 03/05/1928.
(24) Projeto de Lei 636/1959, que autoriza o Poder Executivo a abrir, pelo Ministério da Saúde, o crédito especial de Cr$ 5.000.000,00, como auxílio ao Hospital São Vicente de Paulo, no município de Bom Jesus do Itabapoana, Estado do Rio de Janeiro. Contém Documentação completa do Projeto, além de Estatuto e Relatórios do Centro Popular Pró-Melhoramentos de 1957 e 1958, bem como Planta de Projeto de Ampliação do Hospital. O parecer da Comissão de Orçamento e Fiscalização Financeira, bem como da Comissão de Finanças, foram contrários à aprovação do Projeto, que foi indeferido. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1206700&filename=Dossie-PL%20636/1959 Acesso 27/08/2023.
(25) A Voz do Povo, Bom Jesus do Itabapoana, n.1.148, 31/08/57;
(26) O Norte Fluminense, Bom Jesus do Itabapoana, 28/09/57.
(27) O Momento, Bom Jesus do Itabapoana, n. 11, 16/04/1932.
(28) A Voz do Povo, Bom Jesus do Itabapoana, 26/10/1940.
(29) O Momento, Bom Jesus do Itabapoana, n. 21, 02/07/1932.
(30) A Voz do Povo, Bom Jesus do Itabapoana, 01/03/1958.
(31) O Momento, Bom Jesus do Itabapoana, n. 10, 09/04/1932.
(36) Bom Jesus-Jornal, Bom Jesus do Itabapoana, n.7, 10/05/1928.
(37) O Boletim, Bom Jesus do Itabapoana, Ano I, n.1, 03/10/1939
(38) O Boletim, Bom Jesus do Itabapoana, Ano I, n.9, 06/12/1939
(39) O Norte Fluminense, Bom Jesus do Itabapoana, n. 146, 08/01/1950.
(40) A Voz do Povo, Bom Jesus do Itabapoana, 26/05/1951.
(41) HISTÓRIA. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/conaes-comissao-nacional-de-avaliacao-da-educacao-superior/97-conhecaomec-1447013193/omec-1749236901/2-historia Acesso 22/08/2023.
(42) 25/7: Aniversário de criação do Ministério da Saúde. Disponível em https://bvsms.saude.gov.br/25-7-aniversario-de-criacao-do-ministerio-da-saude-2/ Acesso 26/08/2023.
(43) O Norte Fluminense, Bom Jesus do Itabapoana, n. 1.800, 25/06/1989.
(46) MEMÓRIA: a Capela de Nossa Senhora do Rosário. O Norte Fluminense, Bom Jesus do Itabapoana, 06/08/2023. Disponível em: http://onortefluminense.blogspot.com/2023/08/memoria-capela-de-nossa-senhora-do.html Acesso: 20/08/2023.
(47) LETTIERI, A.P.P.C. Breve descrição das Fachadas do Hospital São Vicente de Paulo e Capela Nossa Senhora do Rosário. Disponível em: http://espacoculturallucianobastos.blogspot.com/2023/09/breve-descricao-das-fachadas-do.html Acesso: 09/09/2023.
(48) LETTIERI, A.P.P.C.; REGO, A.Q. Covid-19 e transformações na paisagem: o Hospital São Vicente de Paulo, Bom Jesus do Itabapoana/RJ. Paisagens Híbridas, v.3, n.1, p.92-123, 2003. Disponível em: https://revistas.ufrj.br/index.php/ph/article/view/57554 Acesso 03/09/2023.