quarta-feira, 17 de março de 2021

Professoras e escolas femininas em Bom Jesus do Itabapoana no século XIX


Jornal Gazeta de Notícias, 20.02.1880

Esse texto busca trazer pistas que possam contribuir para o resgate de algumas mulheres que atuaram como professoras em escolas femininas e mistas em Bom Jesus do Itabapoana, no século XIX.

Escolas para meninas nos oitocentos

Desde 1827, a educação de meninas estava prevista no Brasil, com uma lei estipulando a existência de escolas primárias em vilas e cidades, para meninas e meninos. Durante décadas, porém, grande parte dessas localidades continuou sem escolas, sendo poucos os registros de sua instalação. Assim, não é por acaso que o número de pessoas que sabiam ler e escrever fosse muito pequeno nessa época. Em 1872, por exemplo, esse universo representava apenas 19,8% da população masculina e 11,5% da população feminina. O crescimento do número de alfabetizados que ocorreu nas últimas décadas do século XIX foi maior nos centros urbanos, que também viu crescer o número de mulheres alfabetizadas, realidade não acompanhada nas vilas e cidades do interior. Acrescido a isso, o acesso ao ensino secundário era um problema por sua escassez, especialmente para as mulheres. A coeducação, em geral, não era bem vista por muitos, sendo geralmente mais aceitas em cidades menores, que buscavam driblar a falta de recursos, criando escolas mistas para utilizar uma única instalação (1,2).

Se ao homem era atribuída, inicialmente, a tarefa do ensino, é interessante observar que a implantação de escolas mistas contribuiu para aumentar a oportunidade de as mulheres entrarem para o magistério, “porque se podia confiar a regência das aulas mistas às mulheres, e não limitá-las a só lecionar nas escolas para meninas”(1, p.468).

De arraial a freguesia, Bom Jesus pede escola

Na década de 1860, em Bom Jesus, junto com o movimento pela transformação de arraial em freguesia, há a demanda pela implantação de escola pública, já havendo no local uma escola particular para meninos sob a direção do vigário local. Em 1862, é instalada a Freguesia do Senhor Bom Jesus do Itabapoana, do município de Campos (3, 4).

Professoras na Freguesia

A escola pública para meninas, instalada na Freguesia, teve como professora, durante vários anos da década de 1870, a Sra. Etelvina Hermínia Nunes Madruga. Em fins de 1880, a professora foi removida para a escola de Guarulhos, no mesmo município, e em 1882, consegue, a pedido, retornar à região, dessa vez atuando na recém-criada escola de Varre-Sai (5,6,7,8, 9, 10, 11).

O mineiro Basílio Furtado, que passou por Bom Jesus em 1873, conta que havia na freguesia duas escolas públicas para ambos os sexos e um colégio particular para meninos. Indica que externamente os edifícios não pareciam adequados para serem utilizados como colégios, mas apesar de não ter podido visitar seu interior, teve informação de que as escolas eram frequentadas por um bom número de alunos e as cadeiras eram bem regidas, porém não menciona o nome dos professores. Para visitar seu interior, necessitava da autorização do inspetor paroquial, porém este estava “constantemente ausente para a cidade de Campos”, de forma que o viajante não conseguiu obter mais informações sobre as escolas públicas, como desejava (12, p.29).

Ana Moreira da Silva Dias Ribeiro, que teria chegado a Bom Jesus em 1870, junto com seu marido, então recém-nomeado professor na Freguesia, é apontada, em matéria de jornal de 1932, como tendo sido professora pública por muitos anos nessa localidade, porém não foi possível detectar se sua atuação teria ocorrido em fins do século XIX ou início do século XX (13).

Há registro de nomeação de algumas professoras para a escola da Freguesia de Bom Jesus, mas que provavelmente não chegaram a assumir no local. É o que parece indicar, por exemplo, o caso de Maria Adelina Cesar, que foi nomeada, em 1881, professora habilitada pela Escola Normal para reger, como efetiva, a escola de 1ª categoria da Freguesia de Bom Jesus, porém ao mesmo tempo designada para reger a escola de sexo feminino, de 2º categoria e recém-instalada, em Sete Pontes, Freguesia de São Gonçalo, em Niterói (14).

É possível, assim, que no ano de 1881 a escola de 1ª categoria da Freguesia de Bom Jesus tenha ficado algum tempo sem professora, uma vez que Carlota Felicidade Maciel Arêas foi nomeada como professora provisória nessa Freguesia apenas em 1882, sendo transferida em 1883 para a escola de Travessão, no mesmo município (15, 16).

Em 1885, Elisa Teixeira Rangel dos Santos atua como professora, na escola da Freguesia do Senhor Bom Jesus. No ano seguinte, nos meses de outubro e novembro de 1886, a Freguesia conta com Maria Olímpia de Figueiredo Pimentel como professora substituta na escola pública para meninas (17, 18).

Em 1887, a vaga da escola da Freguesia de Bom Jesus é ocupada pela professora em disponibilidade Ana Campos do Nascimento (19).

Durante todo o ano de 1888, Carolina da Cunha Duque Estrada atua como professora substituta na escola para meninas e, no mesmo ano, assume a escola da Freguesia a professora Henriqueta Coimbra (20, 21).

Maria Borges da Silveira, natural de Niterói e formada em 1881 pela antiga Escola Normal daquela cidade, é designada, em 1893, como professora da escola mista da Freguesia de Bom Jesus do Itabapoana, onde passou a morar com a família. A Freguesia agora integra o município de Itaperuna (22, 23).

Algumas perguntas

Após essa concisa relação, muitas perguntas se levantam, dentre elas: Que matérias seriam ensinadas nessas escolas e qual a qualidade desse ensino? Quantas alunas teriam estudado nessas escolas mistas e femininas e qual o seu perfil? Como as mulheres professoras eram vistas e se relacionavam com a sociedade local?

As "pedagogias" e as diferenças

Na primeira lei de instrução pública do Brasil, as “pedagogias” indicadas para ensino nas escolas tinham, em comum para os meninos e as meninas, o aprender a ler e a escrever, com noções de gramática, bem como aprender a contar e fazer as quatro operações matemáticas. Diferenciando os sexos, havia o ensino das tarefas manuais, de costura e bordado, para as meninas, e o ensino de geometria para os meninos (2, 24).

Vale ressaltar que essa divisão entre meninas e meninos não era a única forma de distinção no processo educacional, pois “as divisões de classe, etnia e raça tinham um papel importante na determinação das formas de educação utilizadas para transformar as crianças em mulheres e homens” (24, p.444).

Alguns dados sobre alfabetização e alunos na Freguesia

Os dados disponíveis sobre a Freguesia, em 1881, podem fornecer subsídio para refletir sobre essas distinções. De um total de 4.140 pessoas contabilizadas como habitando a freguesia, apenas 26,5% sabiam ler. O analfabetismo era de 100% entre a população escravizada e de 61,5% entre a população livre. Os alunos, com idade entre 6 e 15 anos, incluídos os ingênuos, eram 457 do sexo masculino e 428 do sexo feminino. Desse total, a frequência à escola era de 160 meninos e 40 meninas, o que representa 35% do total de meninos e apenas 9,3% das meninas em idade escolar. É possível perceber, também, que as meninas representam 20% das crianças que frequentam escola naquele ano (25).

Professoras, família e vida em Bom Jesus

Sobre as professoras, é interessante observar que algumas delas possuíam esposos que também atuavam na área da educação. Carolina da Cunha era casada com Augusto Dias Falcão Duque Estrada, que foi professor provisório, na década de 1880, na escola da Freguesia, tendo sido declarado efetivo em 1890 (26, 27, 28).

Etelvina Hermínia Nunes Madruga tinha por esposo Antonio Luiz Fagundes Madruga. Ambos foram nomeados professores públicos efetivos de 1ª classe em 1870, atuando na Freguesia de São José do Ribeirão, em Nova Friburgo. Um ano depois, Antonio Madruga é exonerado da função de professor primário a bem do serviço público, atuando como escrivão no mesmo município. Em 1877, quando sua esposa já se encontra atuando como professora da escola pública para meninas em Bom Jesus, o marido mantém uma escola particular para meninos na mesma Freguesia. Em 1881 é readmitido, a pedido, no quadro de professor público e em fins do mesmo ano é designado para assumir a escola de 1ª categoria de Varre-Sai, local para onde sua esposa será removida, em 1882. (6, 10, 11, 29, 30, 31,32)

Ainda sobre a professora Etelvina Hermínia, um fato que merece menção é o processo em que se viu envolvida. Em março de 1878, sua solicitação de licença por dois meses é acolhida, sem vencimento. No mês de maio, porém, é publicada sua demissão pela Diretoria de Instrução Pública, aparentemente sob a alegação de abandono de classe. Provavelmente, o caso ocorre por disputas e intrigas que giram em torno de questões políticas. De um lado, pessoas se mobilizam na defesa de Etelvina, buscando seu retorno como professora da escola pública; de outro, acusações de a professora já ter sido exonerada anteriormente, em 1872, e de ser ela a causa da baixa frequência de alunas na escola de meninas. Dentre os integrantes no primeiro grupo está José Carlos de Azevedo Lima, subdelegado de polícia da Freguesia e que é, como o marido de Etelvina, um dos eleitores da Freguesia. No segundo grupo está Flausino da Costa Soares, fazendeiro com terras em Bom Jesus e Cantagalo, e que exerce, em 1880, o cargo de inspetor de distrito na Freguesia do Senhor Bom Jesus. A reintegração de Etelvina à escola em que lecionava, como professora efetiva, ocorre apenas em maio de 1880, mais de dois anos após sua exoneração (5, 33, 34, 35,36,37, 38, 39, 40, 41, 42).

Outra professora cujo esposo era professor é Ana Moreira Dias Ribeiro, casada com Antonio Luiz Martins Ribeiro, que em 1870 foi nomeado professor público efetivo de 1ª classe na Freguesia do Senhor Bom Jesus do Itabapoana, dando aula para a escola de meninos por muitos anos nessa localidade. Durante o curto período de existência do município de Itabapoana (1890-1892), Antonio Luiz foi nomeado, em 1891, tabelião de notas e escrivão do registro público da Comarca, ficando conhecido, posteriormente, como “Seu Ribeiro Escrivão” (5, 6, 7, 13, 43, 44, 45).

Ao que tudo indica, dentre as professoras aqui mencionadas, apenas Ana Moreira da Silva Dias Ribeiro, Carolina da Cunha Duque Estrada e Maria Borges da Silveira fixaram residência em Bom Jesus e aí permaneceram com a família.

Ana Moreira Dias Ribeiro, conhecida como Dona Aninha, morava, em 1932, no centro de Bom Jesus, próximo ao Cine Bom Jesus, onde é hoje a esquina das ruas XV de novembro e Ten. José Teixeira, e tinha a tradição de festejar o dia de Santo Antonio, com festa que seria bastante apreciada pelos moradores locais (13).

Já Maria Borges da Silveira, mudou-se para Bom Jesus com os sete filhos. O marido, Antônio Ignácio da Silveira, que conhecera na localidade em que assumiu sua primeira escola, e com quem se havia casado em 1884, já havia chegado a Bom Jesus antes da transferência da esposa. Antônio também esteve envolvido no apoio à primeira emancipação de Bom Jesus. Vale mencionar que dois dos netos do casal, Roberto Silveira e Badger Silveira, nascidos em Bom Jesus do Itabapoana, vieram a se tornar governadores do Estado do Rio de Janeiro, nos anos 1959-1961 e 1962-1964, respectivamente (23).

Essas são, em linhas gerais, algumas das teias que envolvem professoras e escolas para meninas, no período dos oitocentos, na região de Bom Jesus do Itabapoana, RJ.

                        Claudia Martins Borges Bastos
                        Paula Aparecida Martins Borges Bastos
                                                                      
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REFERÊNCIAS

(1) HAHNER, J.E. Escolas mistas, escolas normais: a coeducação e a feminização do magistério no século XIX. Estudos Feministas, Florianópolis, v. 19, n.2, 2011, p.467-474.

(2) OLIVEIRA, A.V. A Constituição da Mulher Brasileira: uma análise dos estereótipos de gênero na Assembleia Constituinte de 1987-1988 e suas consequências no texto constitucional. Rio de Janeiro, 2012, 465p. Tese de Doutorado. Departamento de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Capítulo 2: A construção do imaginário sobre a mulher brasileira e o feminismo no Brasil, p.82-191.

(3) ANAIS da Assembleia Legislativa da Província do Rio de Janeiro, 1863.

(4) _____ da Assembleia Legislativa da Província do Rio de Janeiro, Ordem do Dia n.25, 04 de novembro de 1862.

(5) ALMANAK Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e Província do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1876.

(6) _______. Rio de Janeiro, 1877.

(7) _______. Rio de Janeiro, 1878.

(8) MONITOR CAMPISTA, Campos dos Goytacazes, 28 de setembro de 1880.

(9) _______, Campos dos Goytacazes, 02 de outubro de 1880.

(10) ______, Campos dos Goytacazes, 05 de agosto de 1882.

(11) ______, Campos dos Goytacazes, 24 de setembro de 1882.

(12) FURTADO, Manoel Basilio. Itinerario da Freguezia do Senhor Bom Jesus do Itabapoana á Gruta das Minas do Castello. Campos dos Goytacazes, RJ: Essentia Editora, 2014. 119 p. Obra original de 1884.

(13) O MOMENTO, Bom Jesus do Itabapoana, 09 de julho de 1932.

(14) O FLUMINENSE, Niterói, 27 de março de 1881.

(15) MONITOR CAMPISTA, Campos dos Goytacazes, 28 de novembro de 1882.

(16) _____, Campos dos Goytacazes, 15 de agosto de 1883.

(17) GAZETA DA TARDE, Rio de Janeiro, 05 de outubro de 1885.

(18) PROCURAÇÃO, 18 de dezembro de 1886. In: Livro de notas da Freguesia do Senhor Bom Jesus do Itabapoana, município de Campos, 1886.

(19) DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Niterói, 1º de abril de 1887.

(20) PROCURAÇÃO, 4 de abril de 1888. In: Livro de notas da Freguesia do Senhor Bom Jesus do Itabapoana, município de Campos, 1888.

(21) DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Niterói, 12 de julho de 1888.

(22) GAZETA DE NOTÍCIAS, Rio de Janeiro, 08 de janeiro de 1893.

(23) ROCHA, José Sérgio. Roberto Silveira: a pedra e o fogo. Niterói: Casa Jorge Editorial, 2003.

(24) LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: PRIORE, Mary Del (Org.). História das mulheres no Brasil. 10 ed. São Paulo: Contexto, 2018.

(25) ALMANAK Industrial, Mercantil e Administrativo da Cidade e Município de Campos. Rio de Janeiro, 1881.

(26) O FLUMINENSE, Niterói, 18 de fevereiro de 1881.

(27) DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Niterói, 18 de fevereiro de 1886.

(28) O CRUZEIRO, Rio de Janeiro, 05 de março de 1890.

(29) DIARIO do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,14 de outubro de 1870.

(30) _____. Rio de Janeiro, 17 de junho de 1871.

(31) GAZETA DE NOTÍCIAS. Rio de Janeiro, 20 de outubro de 1881.

(32) JORNAL DO COMÉRCIO. Rio de Janeiro, 12 de novembro de 1881.

(33) O CRUZEIRO, Rio de Janeiro, 02 de março de 1878.

(34) _______, Rio de Janeiro, 18 de julho de 1878.

(35) A REFORMA: Órgão Democrático, Rio de Janeiro, 14 de agosto de 1878.

(36) GAZETA DE NOTÍCIAS, Rio de Janeiro, 13 de dezembro de 1878.

(37) JORNAL DO COMÉRCIO, Rio de Janeiro, 29 de dezembro de 1879.

(38) _______, Rio de Janeiro, 30 de maio de 1880.

(39) MONITOR CAMPISTA, Campos dos Goytacazes, 09 de junho de 1880

(40) O FLUMINENSE, Rio de Janeiro, 16 de junho de 1880.

(41) ________, Niterói, 18 de julho de 1880.

(42) ALMANAK Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e Província do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1880.

(43) DIÁRIO DO RIO DE JANEIRO, Rio de Janeiro, 15 de setembro de 1870.

(44) GAZETA DE NOTÍCIAS, Rio de Janeiro, 19 de agosto de 1891.

(45) DUTRA, Antônio. Páginas memoráveis de Bom Jesus do Itabapoana. Editadas por Delton de Mattos. Rio de Janeiro: Textus, 2004.






segunda-feira, 1 de março de 2021

COLÉGIO RIO BRANCO: TURMAS DE 1976


CURSO GINASIAL
















Para recordar, veja o desfile de comemoração do Sete de Setembro, em 1976, no canal do ECLB do YouTube.

VÍDEO

Desfile do Colégio Rio Branco, 1976, Comemoração do Sete de Setembro, na Praça Governador Portela

Disponível em: 

https://youtu.be/zviEswWzbYA?si=bSjVer6q0IXY-JdG


Registro histórico da Praça Governador Portela, em Bom Jesus do Itabapoana, RJ, em 1976, com o Desfile Escolar do Colégio Rio Branco, durante as comemorações do Dia da Independência do Brasil. 

Versão original em 8 mm sem áudio. 

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