Paula Borges Bastos
Bom
Jesus do mira dos pesquisadores: levantamento da flora na região em 1982
Entre junho e dezembro
de 1982, um grupo de pesquisadores percorreu o município de Bom Jesus do
Itabapoana, estendendo-se também pelos arredores do Espírito Santo, no Vale do
Itabapoana. Seu objetivo era detectar o que havia na região de vegetação
primária, ou seja, aquela vegetação nativa, primeira. Passaram por várias
estradas, visitaram várias propriedades, recolheram diversos espécimes de
plantas para identificação, e chegaram à conclusão de que... praticamente nada havia
restado da vegetação primária em nossa região...
O trabalho desenvolvido
por Jorge Pedro Pereira Carauta (técnico do Herbário Alberto Castellanos) e bolsistas
do CNPq e Capes foi apresentado em forma de artigo no periódico ALBERTOA, do
Departamento de Botânica do Museu Nacional, no ano de 1989 (referência
completa no final deste texto).
O resultado encontrado pelos
pesquisadores não chega a ser novidade para os que aqui vivem e estão
acostumados a esses nossos morros descascados e nossa mata ciliar rala e
desdentada.
Importa é pensarmos o
que estamos fazendo e o que ainda podemos fazer, passados mais de 30 anos dessa constatação científica, para
tentar reverter, individual e coletivamente, essa nossa paisagem calorífera e
esburacadamente avermelhada.
Quando em todo o mundo se discute amplamente as mudanças climáticas por que passamos, e as formas por que nossa sociedade humana pode tentar, senão reverter, ao menos minimizar ou retardar ao máximo essas alterações, podemos perceber que essa não é uma discussão longínqua ou distante de nossa realidade. Basta olharmos ao nosso redor. E buscarmos agir com uma consciência de respeito pelo ambiente em que vivemos (e do qual necessitamos).
Quando em todo o mundo se discute amplamente as mudanças climáticas por que passamos, e as formas por que nossa sociedade humana pode tentar, senão reverter, ao menos minimizar ou retardar ao máximo essas alterações, podemos perceber que essa não é uma discussão longínqua ou distante de nossa realidade. Basta olharmos ao nosso redor. E buscarmos agir com uma consciência de respeito pelo ambiente em que vivemos (e do qual necessitamos).
Algumas dicas foram
dadas na época em “Vegetação de Bom Jesus do Itabapoana, RJ. Observações preliminares e
propostas conservacionistas”, de Carauta e colaboradores. A pergunta é: o que estamos fazendo com essas observações?
Nos
primórdios: a região no século XIX
Como não poderia deixar
de ser (como aconteceu em quase todo nosso Brasil), foi através dos relatos de
um viajante do século XIX que ficamos conhecendo um pouco sobre o Vale do Itabapoana
daqueles tempos. Assim, nossa referência inicial em termos de fauna e flora
encontra-se nos relatos do Príncipe Maximilian Wied-Newied, que passou por
essas paragens no ano de 1816. Sua obra encontra-se disponível em formato
digital na Biblioteca Brasiliana, e a referência a nossa região está
especialmente relatada no capítulo V.
Bem, no artigo
sobre Bom Jesus publicado pela ALBERTOA, os autores informam que todo material coletado
pelo Príncipe alemão encontra-se no herbário do Jardim Botânico Nacional de
Bruxelas (Bélgica), com algumas duplicatas em herbários de Genebra (Suíça),
Göttingen (Alemanha) e São Petersburgo (Rússia). Deste modo, dizem Carauta e
colaboradores “quem desejar conhecer as espécies ocorrentes na vegetação
primitiva do Vale do Rio Itabapoana deverá examinar esses materiais nos
herbários mencionados. No Brasil nada ficou!”.
No início da
colonização da região, em meados do século XIX, a exploração da floresta foi
uma importante fonte de renda para os recém-chegados, e essa base econômica
perdurou até finais do século, como podemos perceber no livro de Luciano
Bastos sobre Bom Jesus nos anos de 1890-1892. Nesse período, segundo o livro, as atas da municipalidade
apontam que os valores cobrados em imposto pela madeira extraída foi fixado, em 1891, "de 2.000 réis por tora de jacarandá tendo no máximo 3m e 50cm. de comprimento; 500 réis por tora de qualquer outra espécie de madeira".
Depois da exploração de
madeiras de lei como o jacarandá, o sobro, o vinhático, a peroba, o tapinhoã, o
cedro e a canela, juntamente com o plantio do café, surgiu o ciclo da
cana-de-açúcar e da criação de gado, e assim as terras bonjesuenses chegaram,
na década de 80 do século XX, a uma situação de “magras capoeiras” e “quase
total destruição das florestas”, segundo Carauta e colaboradores.
Caminhos
percorridos para coleta da flora bonjesuense em 1982
Ao percorrerem o Vale
do Itabapoana, os autores apontaram as localidades em que detectaram florestas
mais representativas do município, sendo: “Fazenda do Dr. Columbino, Barra do
Pirapitinga, Calheiros, Cachoeira da Fumaça, Fazenda São Jorge (Carabuçu),
Fazenda do Bálsamo (Rosal), Fazenda Boa Esperança (perto de Mutum), arredores
da cidade e matas limítrofes do Estado do Espírito Santo (Bom Jesus do Norte,
Airituba, São José do Calçado)”.
Há um breve relado sobre o estado de conservação dos locais visitados, apontando o tipo de flora encontrado
na Fazenda Boa Esperança (Carabuçu), Estrada entre Airituba e São José do
Calçado (ES), Estrada entre Bom Jesus do Itabapoana e Calheiros, Cachoeira da
Fumaça (próxima a Calheiros), Fazenda São Jorge (Carabuçu).
Merece destaque a
Fazenda São Jorge, onde foi encontrada uma “ilha” de vegetação bem conservada,
com aproximadamente três quilômetros de diâmetro e com árvores que podem ter
sido de mata primitiva. Segundo os autores “as matas de tabuleiro são muito
importantes, pois representam o limite meridional deste tipo de vegetação, que
ocorre desde o sul da Bahia e norte do Espírito Santo”. Somente na Fazenda São
Jorge foi encontrado esse tipo de formação. No local são encontradas árvores de
25-30 metros de altura, e seus nomes científicos são elencados.
Fonte: Carauta et al. (1989) |
Uma
flora especial do Vale do Itabapoana é descoberta na Fazenda São Jorge: a Dorstenia bonjesu
Os autores apontam que
“Nesta floresta de excepcional interesse florístico, pertencente à Fazenda São
Jorge é que descobrimos a Dorstenia bonjesu – assim denominada para deixar
perene a caracterização geográfica deste táxon, restrito ao norte fluminense e
sul do Espírito Santo (Carauta & Valente, 1983)”.
Confira a imagem da Dortenia bonjesu coletada em Bom Jesus em http://www.ibot.sp.gov.br/colecoes/herbario/MORACEAE/sp189023.htm#
Confira a imagem da Dortenia bonjesu coletada em Bom Jesus em http://www.ibot.sp.gov.br/colecoes/herbario/MORACEAE/sp189023.htm#
Orquídea
nativa
O Cytorpodium glutiniferum é descrito como uma das orquídeas mais
interessantes encontradas na região, “com suas flores amarelas, vistosas,
distribuídas em panículas densas que chegam a atingir de 2 metros de altura,
além do fato de estar frequentemente associado com formigas, que fazem ninho
entre suas raízes”.
Fonte imagem: http://www.orquidariocuiaba.com.br/fichas-de-orquideas/orquideas-do-pico-da-ibituruna/attachment/cyrtopodium-glutiniferum1/ |
Espécies
para reflorestamento
Uma das propostas
apresentadas pelos autores para auxiliar no trabalho de reflorestamento seria a
criação de um herbário para a flora da região.
Ao término do artigo são
apontadas espécies indicadas para reflorestamento no Vale do Itabapoana. São
elas: angico, garapa, aroeira, pindoba, unha-de-vaca, jequitibá, caviúna,
mulungu, gameleiras, pau d’alho, ingá, jacarandá-de-espinho, folha-santa e
crindiúva.
E terminam afirmando
que “quanto ao estado de conservação, a melhor floresta é a da Fazenda São
Jorge e considerando-se a extrema vulnerabilidade dos últimos remanescentes de
mata em Bom Jesus do Itabapoana, providências imediatas deveriam ser tomadas
para sua conservação”.
Parabéns aos proprietários da Fazenda São Jorges, que souberam preservar durante gerações esse "oásis" florestal. Que seus descendentes continuem com esse exemplo, e que outros esforços de manutenção de florestas possam sempre surgir entre nós!!!
Parabéns aos proprietários da Fazenda São Jorges, que souberam preservar durante gerações esse "oásis" florestal. Que seus descendentes continuem com esse exemplo, e que outros esforços de manutenção de florestas possam sempre surgir entre nós!!!
Referências
BASTOS, L.A. De município a Distrito. Primeira
Emancipação de Bom Jesus do Itabapoana (1890-1892). Coleção Histórias de Bom Jesus, vol. 1. Ed. O Norte Fluminense: Bom
Jesus do Itabapoana, 2008.
CARAUTA, J.P.P.; SZÉCHY, M.T.M.; RIZZINI, C.M.;
ALMEIDA, E.C.; Santos, A.A.; ROSA, M.M.T.; LIMA, H.C.; LIMA, H.A.; BRITO,
A.L.V.T. Vegetação de Bom Jesus do Itabapoana, RJ. Observações Preliminares e
Propostas Conservacionistas. ALBERTOA: Rio de Janeiro, n.15, v. 1, 04 jan 1989,
p. 169-181.
Isotype of Dorstenia bonijesu Carauta & C. Valente [family Moraceae]. Global Plants. Disponível em http://plants.jstor.org/specimen/r000142640?history=true& Acesso em 08 jan 2014.
Isotype of Dorstenia bonijesu Carauta & C. Valente [family Moraceae]. Global Plants. Disponível em http://plants.jstor.org/specimen/r000142640?history=true& Acesso em 08 jan 2014.
ROMANIUC NETO, S. Moraceae. Tipos de Fanerógamas. Instituto de Botânica de São Paulo. Disponível em: http://www.ibot.sp.gov.br/colecoes/herbario/MORACEAE/MORACEAE.htm Acesso em 10 jan 2014.
WIED-NEUWIED, M. Viagem ao Brasil. Tradução de Edgar Süssekind de Mendonça e Flávio Poppe de Figueiredo. Coleção Brasiliana, vol. 1, série 5, 1940. Disponível em: http://www.brasiliana.com.br/brasiliana/colecao/obras/15/Viagem-ao-Brasil-nos-anos-de-1815-a-1817 Acesso em 08 jan 2014.
WIED-NEUWIED, M. Viagem ao Brasil. Tradução de Edgar Süssekind de Mendonça e Flávio Poppe de Figueiredo. Coleção Brasiliana, vol. 1, série 5, 1940. Disponível em: http://www.brasiliana.com.br/brasiliana/colecao/obras/15/Viagem-ao-Brasil-nos-anos-de-1815-a-1817 Acesso em 08 jan 2014.
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Fotos de algumas espécies indicadas pelos pesquisadores para reflorestamento na região do Vale do Itabapoana:
Angico:
Fonte imagem: Agência Embrapa: http://www.agencia.cnptia.embrapa.br/gestor/bioma_caatinga/arvore/CONT000g798rt3n02wx5ok0wtedt39pi09yd.html |
Jacarandá de espinho:
Fonte imagem: http://www.arvores.brasil.nom.br/florin/jacesp.htm |