quinta-feira, 17 de abril de 2025

Memórias do séc. XX: Arlindo Lirio do Vale, um Amanagé no Vale do Itabapoana

No centro: Esio Bastos (E) e Arlindo Lirio do Vale (D), em Bom Jesus do Itabapoana, RJ, 1959. Acervo ECLB.

Por Paula Aparecida Martins Borges Bastos

         

       No momento em que a população local se regozijava com a instalação do município de Apiacá, ES, (a), em 1959, a cidade contava com a presença de um visitante especial. Esse homem era Arlindo Lirio do Vale (b), indígena Amanagé (c), nascido na região amazônica, e a quem a revista Cigarra Magazine se referia, em 1956, nos seguintes termos: “índio autêntico, o Capitão Arlindo Lírio do Vale é chefe político” (1).

       Arlindo Lirio do Vale, nascido na última década do Oitocentos, tem uma história de vida que bem merece ser mais conhecida por todos nós. Como homem indígena e político de seu tempo, depois de atuar em sua região natal, migrou para a capital do Brasil, à época o Rio de Janeiro, na expectativa de poder interferir de forma mais incisiva junto às instâncias de poder e conseguir melhorias para a população indígena a qual dizia representar. Contava, para isso, com as conexões que tinha com políticos de renome nacional, e também com o conhecimento que dizia ter com Cândido Rondon (d), a quem admirava, e que era reconhecido no país como protetor dos povos indígenas.

    A partir de artigos e informações dispersas que encontrei sobre Lirio do Vale, buscarei traçar um esboço de sua trajetória, para seguirmos seus passos até sua chegada ao Vale do Itabapoana.

A origem: filho da Morubixaba Damasia

        Arlindo Lirio do Vale se apresentou em Bom Jesus do Itabapoana como sendo Amanagé e “nascido em terras banhadas pelo rio Ararandêua” (2). Natural do sudeste do Pará, teria nascido em 1895 (3).

         Sua mãe Damasia, de possível origem quilombola, ainda nova foi integrada à comunidade indígena, sendo chefe morubixaba dos Amanagé que habitavam o iguarapé Ararandeua, desde final do século XIX até a década de 1930 (4) (5).

      Damasia teve três filhos: os irmãos Arlindo Lirio do Vale, Filomena e Balbino. Esse último assumiu a chefia dos Amanagé após a morte da mãe, sendo conhecido como Capitão Balbino (4).

         Lirio estudou em um seminário de padres, onde lhe foi ensinado “agricultura tanto pratica como teoria”. No ano de 1922, porém, foi obrigado “a abandonar os estudos”, pois “precisava da carteira de reservista” (4, p.73). Com os conhecimentos adquiridos no colégio, Arlindo passou a integrar o ainda restrito grupo de pessoas  alfabetizadas no Brasil, que na década de 1920 era estimado em 35% do total da população (6).

Atuação nos Postos Indígenas do Serviço de Proteção ao Índio (SPI)

      A experiência de Lirio do Vale com o órgão de Estado precursor da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), parece ter começado nos anos iniciais de existência do SPI. Em sua fundação, em 1910, pelo Presidente Nilo Peçanha, o órgão tinha a sigla SPILTN (e), estando desde sua criação sob a direção de Cândido Rondon.

      A primeira atuação de Lirio do Vale teria sido um trabalho não remunerado, em 1911. Atuou em Postos Indígenas de sua região, e detectando vários problemas, passou a fazer criticas ao que considerava inadequado. O Posto Indígena (PI) do rio Capim, por exemplo, segundo Lirio, se encontrava completamente inoperante, enquanto outros se encontravam ausentes de recursos e de condições de trabalho, o que era necessário para garantir a proteção da população indígena do entorno (4).

     O exemplo de sua mãe como liderança indígena local e a admiração por Cândido Rondon devem ter sido as principais influências que levaram Lirio do Vale a trilhar o caminho que o levou a se compreender como um homem político voltado para a defesa da população indígena. Além disso, sua experiência inicial nos Postos Indígenas deve lhe ter dado condições de ampliar sua consciência na observação da realidade local e dos desafios por que os povos indígenas da região passavam.

   Consciente da importância da política nacional e suas consequências para os povos indígenas, Lirio não hesitou e, consequente com suas expectativas, apoiou a candidatura de Getúlio Vargas para Presidente da República. Sua viagem ao Rio de Janeiro, em 1929, junto com o deputado federal José Joaquim Seabra, ex-governador da Bahia, para fazer campanha a favor de Vargas, pode ser lida como uma demonstração de que nessa época os homens políticos de seu tempo já distinguiam Arlindo como alguém a ser considerado, pois seu apoio poderia significar um potencial capital político (4) (f).

Presidente Getúlio Vargas, quadro pertencente ao antigo Colégio Rio Branco. Acervo ECLB.


       Em 1932, já estando o Brasil sob a presidência de Getúlio Vargas, Lirio está de volta a sua terra e continua desenvolvendo seu trabalho no PI do Rio Capim. Alguns anos depois é nomeado Delegado do Serviço de Proteção aos Índios, e nessa condição passou a “prestar assistencia aos índios do posto de alcobaça, e os índios anaubés do rio cariri”. (4, p. 73)

         Com uma atitude propositiva frente aos Postos Indígenas e suas contínuas demandas e reinvindicações, parece ter havido desconfiança por parte de alguns trabalhadores não indígenas do SPI em relação a Arlindo. Além disso suas críticas, muitas vezes explícitas, quanto à ineficiência de alguns Postos, podem ter gerado algum desconforto nos que ali ocupavam algum cargo (4).

No Rio de Janeiro, capital da República

          A década de 1940 parece ter sido um momento decisivo na vida de Lirio do Vale. Com seu grupo Amanagé sendo liderado pelo irmão Capitão Balbino, Lirio parece ter assumido de vez sua condição de político junto às instâncias de poder da capital, usando sua tática de, como indígena representante de seu povo, lutar por melhorias nas ações das estruturas de Estado voltadas para as questões indígenas.

           Arlindo acabou voltando ao Rio de Janeiro, onde procurou o SPI. O órgão registrou, em 1943, que Lirio ali “ressurge como tendo vindo tratar com o Governo a respeito de assuntos agrícolas e transportes de produtos das duas tribos de índios de quem se diz capitão ou pagé” (4, p.94).

       É possível que ao se decidir por retornar ao Rio de Janeiro, Arlindo Lirio do Vale tenha pensado em conseguir um encontro com o Presidente, na expectativa de expor a situação indígena de sua região e apresentar, na condição de indígena letrado, competente e experiente, as soluções que poderiam advir do que considerava serem ações corretas e concretas a serem tomadas pelo SPI.

      Em 1945, Lirio estava morando, com seus dois filhos mais velhos, no bairro Vaz Lobo, subúrbio do Rio de Janeiro. Ao convencer-se da impossibilidade de tal encontro, naquele mesmo ano, restou-lhe a opção de escrever uma carta ao Presidente da República: “[...] estou nesta capital para falar diretamente com Vossa Ex. e tenho certeza de que Vossa Ex. compreenderá os sentimentos de um índio brasileiro” (4, p.80).

Carta a Getúlio Vargas: "[...] quem pode dar proteção ao índio é o próprio índio (4, p.84)

        Na carta enviada ao Presidente, em 1945, junto com um memorial sobre sua vida e suas experiências nos Postos Indígenas, expunha os problemas que percebia nesses Postos e nas ações do SPI. Nesse contexto, reivindicava ser nomeado para o cargo de Inspetor Geral do Pará, afirmando na carta ter

competência para ser nomeado inspetor em minha terra, como provas de trabalhos prestados ao SNPI e não bastante provarei com documentos, que venho trabalhando sem nada ganhar em prol da grandeza do Brasil” (4, p.81).

      Lirio afirmava que cumpriria com responsabilidade as atribuições referentes ao trabalho do SPI, tais como proteção e assistência indígena, o que, criticava, não ocorria em muitos postos que conhecia e eram comandados por não indígenas. Afirmava-se apto e capaz pois, além de ter estudado matérias básicas e profissionais na juventude, possuía experiência sobre como vinha se dando a atuação dos PI em sua região e, argumento principal, era indígena (4).

      Com sua retórica e argumentação, Lirio do Vale procurava demonstrar que, sendo indígena, possuía melhor capacidade de compreender e organizar os povos da região e, conhecendo suas realidades, atuaria no sentido de buscar apoio e assistência a todos eles, citando algumas das ações as quais se propunha realizar:

farei a união dos índios turis do rio acara, e os índios ananbés do rio carari, com os índios tenbés e amanajás de minha taba em minha terra, pacificarei os índios gaviões e urubus que constantemente atacam o posto de alcobaça, onde com meus próprios olhos pude observar a falta de patriotismo daquele posto” (4, p.79).

        Esses ataques, indicava, não eram gratuitos: “os índios gaviões e urubus que vivem em constantes guerras com os brancos, que invadem os seus domínios” (4, p.82).

       Para Ribeiro (7), muitas situações ocorridas durante o Regime Vargas são exemplares do modo como os indígenas vão redimensionar a tutelagem e elaborar dinâmicas próprias, a partir de suas culturas, cosmologias e territorialidades”. Nesse sentido, aponta, Lirio do Vale é um dos exemplos mais emblemáticos dessa realidade. 

Um discípulo do Marechal Cândido Rondon

         Admirador de Rondon desde seus tempos de atuação nos Postos Indígenas no norte do país, Lirio também enviou, em 1945, uma carta ao então General Cândido Rondon. Nela, solicita apoio para sua indicação ao cargo de Inspetor Geral do Pará, explicando ter enviado carta ao Presidente. Na carta a Getúlio, Lirio do Vale se refere a Rondon como alguém com uma “digníssima carreira protetora”, dizendo-se discípulo capaz de seguir os exemplos de suas façanhas, caso seja nomeado para o cargo pleiteado (4).

Cândido Mariano da Silva Rondon (1865-1958)

      Em 1955, Arlindo Lírio do Vale esteve presente, no Rio de Janeiro, ao evento que comemorou os 90 anos de Candido Rondon, quando o Congresso Nacional, no Palácio Tiradentes, outorgou ao nonagenário o título de Marechal do Exército Brasileiro. Em um vídeo da coleção do “Conselho Nacional de Proteção aos Índios” (CNPI), disponível numa rede social, é possível vislumbrar Lirio do Vale, ao final do ato, seguindo atrás e a direita do Marechal ao iniciar a descida das escadarias do Prédio (veja aqui). Em uma fotografia do lado de fora do Palácio, publicada na parte central de uma página da Revista Manchete, estão o Marechal Rondon e Arlindo Lirio do Vale em primeiro plano, posando para a foto, estando em segundo plano o Senador Nereu Ramos (veja aqui). Arlindo porta um belo cocar e diversos colares com amuletos, confirmando a todos os presentes, com orgulho, sua identidade indígena.

Percorrendo Minas Gerais: difusão das tradições ancestrais e defesa dos povos indígenas

Conferências para difusão da cultura indígena

     Lirio do Vale percorreu diversas cidades mineiras, como Conselheiro Lafaiete e Barbacena, na décadas de 40, fazendo conferências que abrangiam a difusão das culturas e línguas indígenas, bem como das ações e políticas indigenistas de Getúlio Vargas (g). Em um dos panfletos da época, consta a divulgação de uma conferência a ser feita por Lirio do Vale e o indígena Guaicurú Umburaé “em uma das Casas de Diversões da cidade”, onde os dois tratariam de “assuntos inteiramente indígenas, discutindo a língua nativa: TUPÍ E GUARANÍ (...) atenderão com satisfação a todos os interessados (...)”. O panfleto termina fazendo uma ressalva para a população: “Não se trata de feitiçaria nem de bruxaria”.

     No geral, parece que esses eventos eram apreciados pela população, como é possível deduzir pelo ocorrido no Cine Brasil, em Barbacena, em que Lirio é mencionado como “o simpático índio”, que após ter falado “sobre cousas e fatos peculiares à sua gente”, foi “muito aplaudido”. A matéria ressalta que “O cacique Lírio do Vale mostrou ser um grande patriota e amante do crescente desenvolvimento de nossa querida Pátria (...)" (4, p.86).

Em território Xakriabá: apoio à luta pelo direito à terra

       Na década de 1950, Lirio continuava pela região sudeste, percorrendo especialmente o extenso território mineiro. Sua permanência em determinadas localidades, porém, não agradava a todos os moradores, como se observa no ocorrido nos então distritos de Itacarambi e Missões, onde ele e seu filho, Lirio Arlindo do Vale Filho, se envolveram no apoio a indígenas locais que defendiam seu direito à terra. Sua ação de dirigirem-se “aos moradores que não eram descendentes indígenas para orienta-los a se mudarem daquelas terras” (4, p.64) gerou um indiciamento policial, em 1951, no qual eram acusados de ameaçar agricultores e pecuaristas “com a justificativa de que aquelas terras pertenciam aos descendentes dos índios Tupinambá”.

      Os Xakriabá, nesse tempo, se organizavam e tomavam providências para conseguir a posse legal de suas terras. Para isso, suas lideranças faziam viagens ao Rio de janeiro “em busca de apoio, ajuda e informações que nos defendessem”. É possível que Lirio do Vale tenha conhecido algumas dessas lideranças, “como Rosalino e Rodrigo, que denunciaram invasões no território Xakriabá”, dirigindo-se à região para contribuir com seu apoio, consequente com a missão que se propunha na defesa do povo indígena (8).

             O ambiente daquela época, na região, é resumido na seguinte reportagem recente: 

Quando o agricultor José Fiuza Xakriabá nasceu, em 1950, as leis de proteção aos territórios indígenas no Brasil eram frágeis. A Terra Indígena Xakriabá, que hoje abrange 54 mil hectares no norte de Minas Gerais, ainda não havia sido regularizada e era cobiçada por grileiros. Ataques e invasões eram frequentes. Assim, cedo Fiuza entendeu o que era a sina indígena de que seu pai tanto falava: ter de lutar pelo direito à própria existência.” (9)

        A relação de Lirio do Vale com a região do São Francisco parece ser persistente, pois, anos depois, em 1956, Lirio aparece em uma reportagem sobre as Carrancas do rio São Francisco, com uma narração de viagem de barco pelo velho Chico. Dentre as várias fotografias que ilustram a matéria, feitas durante a viagem, consta uma de Lirio do Vale, de perfil, com a legenda: “índio autêntico, o Capitão Arlindo Lírio do Vale é chefe político” (veja aqui). Nenhuma outra menção a ele é encontrada no texto jornalístico, o que permite algumas perguntas: estaria Lirio fazendo a mesma viagem ou estaria em algum dos lugares de parada do barco? Sem resposta, podemos apenas perceber que sua figura chamou a atenção do fotógrafo e do repórter a ponto de terem inserido sua imagem na revista.

Apoio aos Krenak e crítica a Juscelino Kubistchek

       Sempre atento às questões indígenas, Lirio do Vale foi um grande crítico das ações do Presidente Juscelino Kubistchek em território mineiro, “acusando-o estar tomando as terras dos índios Crenaque” (2).

           Com efeito, na década de 1950, os Krenak sofreram o primeiro de “dois episódios de reassentamento forçado promovidos pelo Estado brasileiro” no século XX (h). No ano de 1957,

“foram retirados de suas terras de forma violenta pelos agentes do antigo Serviço de Proteção aos Índios (SPI) e deslocados para as terras indígenas dos Maxacali, em Águas Formosas, no município de Santa Helena de Minas/MG. Eles retornaram em 1959 para seu território tradicional, numa caminhada que durou três meses.” (10)

No Vale do Itabapoana: Bom Jesus do Itabapoana e Apiacá 

       Quando Lirio do Vale esteve em Bom Jesus do Itabapoana, no verão de 1959, um dos lugares que visitou foi a redação de um jornal local, O Norte Fluminense, cujo fundador e diretor, Esio Bastos, era à época vereador em seu terceiro mandato. Como cartão de apresentação, além do documento pessoal, Lirio apresentou a fotografia publicada na Revista Manchete, de 1955, em que aparece ao lado do Marechal Rondon, de quem se dizia amigo, e do senador Nereu Ramos. Essa informação, contida no periódico bonjesuense, permitiu resgatar esse momento de Lirio no Rio de Janeiro, uma vez que a revista carioca não apresenta nenhuma legenda ou menção em texto que possa identifica-lo.

        A matéria de jornal, repleta de adjetivos elogiosos, destaca o "português correto" de Lirio do Vale, o qual é apresentado como “um autêntico chefe indígena” que utiliza "vestes atraentes à altura de sua alta posição". É apresentado como "uma figura forte, vivaz, espetacularmente adornado com colares, penas e pulseiras" (2).

Acervo ECLB
      

       A visita a Bom Jesus se deu numa sexta-feira e movimentou a cidade, com os moradores interessados em conhecer o chefe indígena, em especial as crianças, que o acompanharam por todos os lugares por que passou. É possível perceber na fotografia em que aparece com o jornalista e vereador Esio Bastos (no topo desse artigo), adultos e crianças rodeando os dois homens, entre curiosos e atentos.

Ervas medicinais tradicionais

      Os conhecimentos ancestrais dos Amanagé sobre o uso das plantas para fins medicinais era preservado por Arlindo Lirio do Vale, que muitas vezes empregava e divulgava o uso de receitas de ervas em suas andanças pelo interior do país (4). Em uma sociedade que sempre preservou em suas práticas cotidianas a memória rural do uso de fitoterápicos, as ervas de Lirio do Vale devem ter sido muito consideradas nos lugares por onde passou. Em Bom Jesus do Itabapoana, o Amanagé divulgava “«sua» Erva do Índio (Carucaxá), afirmando a excelência para a cura de diversos males” (2).

Apiacá, Vargas e Lirio

       Lirio do Vale se estabeleceu, no Vale do Itabapoana, em uma localidade que teve sua nomenclatura alterada na onda do movimento modernista que se iniciou no Brasil na década de 1920 e que ganhou maior expressão na Era Vargas, “uma época em que os topônimos de origem indígena foram abundantemente criados no país” (11).

     Foi nesse período que o Presidente Getúlio Vargas assinou o Decreto-Lei nº 5.901, de 21/10/1943 (12), instituindo as normas para nomenclaturas de cidades, com a indicação, em seu art. 7º, III, de que, para as localidades em que houver alteração de nome, é “recomendável a adoção de nomes indígenas”.

        Apenas dois meses após a criação dessa Lei Federal, o Estado do Espírito Santo emitiu o Decreto-lei Estadual nº 15.177, de 31/12/1943, determinando as alterações dos antigos nomes das localidades de Boa Vista e Barra Alegre para Apiacá e Iurú, respectivamente (13).

     Em 1959, vivenciando o clima de satisfação e esperança da população local com a recente emancipação de Apiacá, é possível que Lirio do Vale tenha vislumbrado na localidade a possibilidade de se estabelecer de forma mais permanente na região, pois o redator do jornal O Norte Fluminense destacou estar o indígena naquele momento “residindo em Apiacá onde possivelmente fixará residência” (2).

Vale do Itabapoana, um recanto de memórias Macro-Jê

     

Antiga Fazenda dos Puri, Apiacá, ES. Foto: Paula Bastos, 2023.

        É possível que por suas andanças pela região, Lirio tenha, altivo e ativo, conversado com diversas pessoas sobre ancestralidade e herança indígena, interessado em descobrir sobre vivências e memórias dos povos indígenas de nossa região. É possível que tenha encontrado antigos trabalhadores da Fazenda dos Puri e outros moradores e moradoras que, inspirados, lhe tenham contado sobre sua origem indígena, e com ele tenham trocando receitas com plantas locais.

Antiga Fazenda dos Puri, Apiacá, ES. Foto: Paula Bastos, 2023.
      

     É possível que quando Lírio contasse de sua terra de origem, na região amazônica, o povo do Vale do Itabapoana, entre curioso e atento, tirasse do fundo de suas memórias encobertas, sons de um tempo distante com gosto de presente, passado e futuro.

      Passados 78 anos da demanda de Lirio do Vale ao Presidente Vargas, no ano de 2023 foi empossada a primeira indígena à frente da FUNAI, Joenia Wapichana (11). Nesse mesmo ano, se deu a criação do Ministério dos Povos Indígenas, tendo como Ministra a indígena Sonia Guajajara (12).

***

É permitia a reprodução do conteúdo deste blog em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, desde que citada a fonte e o autor.

Notas 

(a) Elevado a município em 1958, a partir da emancipação de Mimoso do Sul (ES), foi instalado em 29/01/1959, constituído por dois distritos: Apiacá (sede) e Iuru. Ver: https://site.apiaca.es.gov.br/paginas/191

(b) Também grafado em algumas fontes como Lyrio do Valle ou Lirio Arlindo do Vale.

(c) Integrante da família linguística Tupi-Guarani, Amanagé teria como significado "associação de pessoas". Também conhecidos como Amanayé, habitam atualmente o alto curso do Rio Capim. A denominação Ararandeuara foi assumida pelos Amanagé que habitam o igarapé Ararandeua. Lirio do Vale, na década de 1940, também se apresentava como indígena Tembé, povo que ocupava grande área do território onde os Amanagé de Lirio do Vale se encontravam naquela época. Ver: https://antropos.org.uk/5-amanaye-amanage/ ; https://www.etnomuseudigital.com.br/povo/amanaye/ ; https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Amanay%C3%A9 

(d) Militar e sertanista, nasceu em Mato Grosso, em 1865. Participou da Comissão Construtora de Linhas Telegráficas, e nesse trabalho fez contato com diversos povos indígenas, ao andar pelo interior do Brasil. "Embora tenha sido adepto de uma perspectiva integracionista, em voga na época, sua conduta pacifista é admirável", tendo como lema "morrer se preciso for, matar nunca!". Seu trabalho com os indígenas resultou na criação do "Serviço de Proteção ao Índio" (SPI) e depois no "Conselho Nacional de Proteção aos Índios" (CNPI). Faleceu em 1958. Ver: https://portal.sbpcnet.org.br/noticias/calendario-de-fevereiro-destaca-marechal-rondon-e-a-criacao-do-servico-de-protecao-aos-indios-spi/ 

(e) "Serviço de Proteção ao Índio e Localização de Trabalhadores Nacionais".

(f) As relações de Arlindo Lirio do Vale com políticos do período do Governo Vargas podem ser lidas dentro de um movimento geral “como comenta Seth Garfield, [em que] os indígenas foram praticamente convocados por Getúlio Vargas e seus correligionários (políticos e intelectuais) enquanto recurso simbólico do regime que moldava certas representações, discursos e práticas estatais nesse cenário” (7).

(g) Garfield (3) aponta que Lirio criticava “não a missão do Estado de proteger e integrar os índios, mas seu modus operandi” (p.30). O autor aponta as complexidades da época da era Vargas, e remetendo ao conceito de Gramsci sobre “conscientização contraditória”, indica que “o discurso de Valle revela como os índios brasileiros, como outros grupos subalternos, tanto apropriaram-se dos símbolos dominantes como os desafiaram” (p.31).

(h) O segundo episódio se deu em 1972, sob gestão da FUNAI e apoio do Estado de Minas Gerais (10).

Referências

(1) CIGARRA Magazine, SP, ed. 6, junho 1956. Disponível em: https://memoria.bn.gov.br/docreader/DocReader.aspx?bib=003085&pagfis=58490 Acesso 09/04/2025.

(2) CACIQUE indígena esteve em Bom Jesus. O Norte Fluminense, Bom Jesus do Itabapoana, RJ, 01/02/1959.

(3) GARFIELD, Seth. As raízes de uma planta que hoje é o Brasil: os índios e o Estado-nação na era Vargas. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 20, n. 39, p.15-42, 2000. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbh/a/5WGW9qddWRkHSnkrckzLHrx/?lang=pt  Acesso 15/04/2025.

(4) ROSA, Roberta Cristina Silva. Os índios brasileiros e o Serviço de Proteção aos Índios: a atuação de Lyrio Arlindo do Vale (1942-1945). Dissertação (mestrado) Programa de Pós-Graduação em História, UERJ, Rio de Janeiro, RJ, 2016.

(5) GOMES, Jussara Vieira. Grupos indígenas Amanayé e Anambé, do Pará (Relatório), RJ, 28/06/1984. Publicado no Boletim do Museu do Índio, documentação nº 7, dezembro 1997.

(6) TAVERNA, Aline Rosenente; TAVERNA, Maria Rosenente; MELLO, Eloisa Helena. Processo histórico do analfabetismo no Brasil (1500-1945). Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.8, n.9, p.62250-62265, 2022. Disponível em: https://ojs.brazilianjournals.com.br/ojs/index.php/BRJD/article/view/52006 Acesso 15/04/2025.

(7) RIBEIRO, Benedito Emilio. Povos indígenas e o Regime Vargas: tutelagem, resistência e agenciamentos, 16/05/2024. Disponível em: https://www.geledes.org.br/povos-indigenas-e-o-regime-vargas-tutelagem-resistencias-e-agenciamentos/ Acesso 06/04/2025.

(8) XAKRIABÁ. Povos Indígenas no Brasil. Disponivel em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Xakriab%C3%A1 Acesso 15/04/2025.

(9) O GLOBO - https://oglobo.globo.com/ - 27/07/2024. Disponível em: https://www.terrasindigenas.org.br/en/noticia/224888 Acesso 15/04/2025.

(10) MG – Povo indígena Krenak segue lutando por reconhecimento e demarcação total de seu território tradicional (atualização 04/08/2018). Disponível em: https://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/conflito/mg-povo-indigena-krenak-segue-lutando-por-reconhecimento-e-demarcacao-total-de-seu-territorio-tradicional/ Acesso 06/04/2025.

(11) NAVARRO, Eduardo de Almeida. A toponímia indígena artificial no Brasil: uma classificação dos nomes de origem tupi criados nos séculos XIX e XX. Revista Letras Raras. Campina Grande, v. 9, n. 2, p. 252-267, jun. 2020. Disponível em: https://pt.wikisource.org/wiki/A_topon%C3%ADmia_ind%C3%ADgena_artificial_no_Brasil  Acesso 15/04/2025.

(12) BRASIL. Decreto-Lei nº 5.901, de 21/10/1943. Diário Oficial da União - Seção 1 - 23/10/1943, p. 15750. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-5901-21-outubro-1943-415891-publicacaooriginal-1-pe.html Acesso 15/04/2025.

(13) ESTADO do Espírito Santo. Decreto-Lei nº15.177. Imprensa Oficial - Vitória - 1944. Disponível em: https://www3.al.es.gov.br/Arquivo/Documents/legislacao/html/Decreto%2015177%20de%201944.pdf Acesso 15/04/2025.

(14) JOENIA Wapichana é nomeada Presidente da Fundação dos Povos Indígenas (FUNAI). Disponível em:https://www.gov.br/funai/pt-br/assuntos/noticias/2023/joenia-wapichana-e-nomeada-presidente-da-fundacao-nacional-dos-povos-indigenas-funai Acesso 16/04/2025.

(12) MINISTÉRIO dos Povos Indígenas. Disponível em: https://www.gov.br/povosindigenas/pt-br/acesso-a-informacao/institucional Acesso 16/04/2025.



domingo, 13 de abril de 2025

Dia da Poesia bonjesuense no ECLB

                     

O Espaço Cultural Luciano Bastos convida para a comemoração do Dia da Poesia Bonjesuense, no próximo dia 03 de maio, às 19h, no Auditório D. Carmita.

Haverá o lançamento dos livros "Lembranças, crônicas e contos", de Elcio Xavier, "Saudade", de Gedália Loureiro Xavier, "A saudade que não passa", de Rogério Loureiro Xavier, e "Novo legado, um mistério em Bom Jesus", do Poeta Pensante.

Será uma noite única, dedicada aos poetas bonjesuenses, celebrando a beleza das palavras e comemorando o nascimento do escritor bonjesuense Elcio Xavier.

O poeta Elcio Xavier em 1939.

Dia da Poesia Bonjesuense

Data: 03 de maio (sábado) 

Horário: 19h

Local: Espaço Cultural Luciano Bastos

Praça Amaral Peixoto 13, centro, Bom Jesus do Itabapoana, RJ.


Sobre a vida e obra de Elcio Xavier:

https://onortefluminense.blogspot.com/2015/05/95-anos-de-elcio-xavier.html



Índice de Vídeos antigos do Canal do ECLB no YouTube

Digitalização de acervo audiovisual: Tais Borges do Carmo 

Em 2014, o Espaço Cultural Luciano Bastos (ECLB) iniciou um Projeto de Conservação Digital de seu acervo, uma ação importante de preservação e acesso à memória escolar do Colégio Rio Branco e da história e memória da região do Vale do Itabapoana. (Veja aqui ) Os vídeos editados, que fazem parte do nosso patrimônio histórico, estão disponíveis no canal do ECLB no YouTube.

Para facilitar a pesquisa, apresentamos a tabela abaixo com os vídeos antigos já editados, com uma identificação e o respectivo link:
 

ANO

EVENTO

LOCAL

LINK

1976

Desfile escolar

Sete de Setembro

Praça Gov. Portela

https://youtu.be/zviEswWzbYA?si=6gZDOF24WuEbqDLJ

1987

Formatura - 1

Cineteatro Monte Líbano

https://youtu.be/tf27UlrlY58?si=zXVrx5x-oNsoCFG6

1987

Formatura - 2

Cineteatro Monte Líbano

https://youtu.be/tf27UlrlY58?si=zXVrx5x-oNsoCFG6

1989

Jogo Olympico F.C.

Olympico F.C.

https://youtu.be/U4rAPMZ1LF8?si=hu0Becaf2gY9X2ZS

1989

 

Desfile escolar Festa de Agosto

Praça Gov. Portela

https://youtu.be/0IYLeHKjkkw?si=60uv0Ne0FswPT2hr

1989

Desfie C. Zelia Gisner e Téc. Agrícola

Praça Gov. Portela

https://youtu.be/I2Ac0t6Q2q0?si=SA7q0XGDp-CSVIMC

1989

Formatura – 1

Cineteatro Monte Líbano

https://youtu.be/VcPHNjer6gA?si=BKMpoAVUe0alMH-a

1989

Formatura - 2

Cineteatro Monte Líbano

https://youtu.be/IIXXixuYSWg?si=K65wfVm64MW-8kE2 

1990 

Dia das Mães - 1

Déc. 1990          

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/HrZCvXyglcU?si=zXIVCwejdIxLBymr

1990

 

Dia das Mães - 2

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/uNup-Gz4G4M?si=WHm7jyVevzhVrVic

1990

Formatura – 1

Aero Clube

https://youtu.be/8KGfwBqn9Nw?si=IWMD7MueY1HijvLt

1990

Formatura – 2

Aero Clube

https://youtu.be/SU8EDEPgkXU?si=pAQ5qbNWxdxAnB7d

1991

Um dia de aula         

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/siNsASbuuXg?si=DB8OMwJTaKVXBfZL

1993

Dia da Normalista    

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/CuMQk09ljiY?si=iyt4icsOsiMO5ESm

1994

Orquestra Ligiero

Baile da Saudade      

Aero Clube

https://youtu.be/tRd2OK0C3vw?si=U5-0A2-cv5IVLpR7

1994

Preparação

Desfile escolar

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/VaKn263WpFU?si=jFEsOIkfDq2lg7He

1994

Desfile escolar   Festa de Agosto           

Praça Gov. Portela

https://youtu.be/LMN2ACB1yJY?si=fcSvbvF7o1aGW4DQ

1994

Festa de Agosto   Lira Operária

Praça Gov. Portela

https://youtu.be/ttiCCpuzrL4?si=hKRHkk3zaG7Cj9nO

1994

Festa de Agosto

Lira 14 de Julho

Praça Gov. Portela

https://youtu.be/gd7LsU7boqE?si=sOf1ZyhMOOmm1XkJ

1994

Formatura – 1

Cineteatro Monte Líbano

https://youtu.be/VcPHNjer6gA?si=BKMpoAVUe0alMH-a

1994

Formatura – 2

Cineteatro Monte Líbano

https://youtu.be/IA0-BA49aAU?si=RtYL1WxU6ZfbknRe

1995

Festa Junina

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/6PVLfxjod1Q?si=5EHfFpzDuVi6hoLB

1995

Desfile escolar

Festa de Agosto

Praça Gov. Portela e arredores

https://youtu.be/Dnln2cHwgbk?si=x76UbkyGqieDyZW-

1996

Feira de Ciências      

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/4B3lGeDpspc?si=1yif7Fyoe3q7GogZ 

1996

Festa Fim de ano

Turmas infantis

Aero Clube

https://youtu.be/heG6zqamULA?si=bQnqZDhyBJ_iGN8g

1997

Jogos Estudantis

Olímpico F.C.

https://youtu.be/6rxNp8t7UW4?si=D4gjldYlP1sJeD0z

1997

D. Clarice B. Oliveira   Homenagem

Residência D. Clarice

https://youtu.be/vSg7Vc5JNP0?si=8WZjXS5dv7r5oVbK

1999

Páscoa

Colégio Rio Branco

 https://youtu.be/ocHIOx2EL8w?si=NcVI7bymMA_BhWaU

2000

Festa Junina

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/JtMGMGVQgIc?si=JT8p2wbh4vnz0iSx

2002

Festa Junina

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/06MRC6HiSZA?si=zlaUtRsHSFuPiZ3G

2003

Festa Junina

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/_VxClrUJ3U4?si=HsLpqmUjB8pnnR9H

2003

Dia do Professor

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/GHm4BOS1IoI?si=ZuAlxritCxI-7Rae

2003

Jogos Estudantis       

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/GpUSjxC2T2c?si=r08_nhoMATaG3q_2

2003

Julia Moreira             Dia da Normallista

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/mJGF27Pb2Zw?si=InlzMaj9lhB0-_ay

2003

Formatura - 1           

Aero Clube

https://youtu.be/WY7g96fjhe8?si=XzWiwUatBK-4rKmf

2003

Formatura - 2  

Aero Clube

https://youtu.be/K55WYCT7rrI?si=MGqKL0kbc6bpKaEA

2003

Festa de Fim de ano   Turmas Infantis  

Aero Clube

https://youtu.be/8ict6-_TSsM?si=3XH92prG8cJBOXzf

2006

II Feira de Artes

Colégio Rio Branco

https://youtu.be/0D6CcHG9nUg?si=arDsNalT5G7ToW9a

2006

Festas Fim de ano   Turmas Infantis

Aero Clube

https://youtu.be/BdnibTwjl8c?si=VYpI-Xayt9hleqMc