quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

"Parker 51": Neumar Monteiro relembra o Ginásio Rio Branco



Da escritora e poetisa Neumar Monteiro, reproduzimos texto postado nas redes sociais: “Parker 51”, em que relembra a época em que estudou no Ginásio Rio Branco.





UMA PARKER 51
  

Neumar Monteiro, Nov. 2006

Há dias escrevi a crônica “Uísque com Guaraná”, quando retirei do baú da memória saudosas imagens dos anos sessenta e setenta. Um fio puxa o outro, e lá vieram recordações ainda mais antigas que muito me emocionaram. Lembrei-me das elegantes canetas-tinteiro, dos clássicos lápis Johan Faber e dos inesquecíveis papéis mata-borrão, usados para absorver o excesso de tinta que ficava do uso das canetas-tinteiro.
Nunca possuí uma caneta-tinteiro, pois crianças só escreviam com lápis sob pena de ficar de castigo. Papai tinha uma, bem como o senhor da Tipografia e o dono do armazém em que fazíamos compras, que ficavam no bolso da camisa dando - lhes imponência e um certo ar aristocrático. Homem elegante usava Parker 51, sonho de consumo de todo jovem alguns anos depois.
É bom resgatar essas páginas perdidas. Sentir, ainda hoje, o cheiro de caderno novo encapado com papel-manteiga, mais tarde substituído pelo papel jornal. E as caixas de lápis, para desenho, de 24 cores? Uma cobiça nunca realizada! Caros demais para as mãos da criança pobre. Até hoje fico fascinada quando vejo alguma. Culpa da infância descolorida e desbotada.
Dos primeiros anos do colégio Rio Branco então chamado Ginásio Rio Branco, lembro-me dos famosos “combates” realizados aos sábados pela manhã, que consistiam na divisão da turma em dois partidos, debatendo, um contra o outro, sobre determinada matéria ensinada durante a semana. À turma vencedora cabia um Mapa-Múndi ou caixas de lápis de seis cores. De cada sabatina saíamos mais afiados, aptos a repetir, no decorrer da vida, as lições aprendidas tantos anos antes.
Até as carteiras eram especiais, por possuírem um orifício para acomodar o tinteiro, usado, por nós, como depósito de borrachas ou giletes. Recordo-me, também, dos nomes escritos nas carteiras, às vezes de conteúdos menos elegantes que coravam as meninas e provocavam a ironia dos meninos. Certo é que algumas estampavam inocentes declarações de amor dos enamorados da sala. Era terrível e gostoso desnudar, aos olhos da turma, sentimentos guardados a sete chaves. A vergonha era tanta que doía com dor de queimar por dentro. Assim é como posso descrevê-la.
Tudo é passado, mas não perdido. Até hoje busco os ensinamentos daqueles tempos para aplicação no dia-a-dia. Da Literatura dos bancos escolares sorvi o gosto e conheci autores famosos. Do Latim do Dr. Ilis Carlos Machado ao Português do Dr. José Ronaldo do Canto Cyrillo, um universo de conteúdos sempre atuais, conquanto ministrados décadas atrás.
De tudo que vi aprendi um pouco, o que me faz cidadã capaz de contornar muitos conflitos, respeitar diferenças e sobreviver com dignidade num mundo de tantas inconveniências. No mais, passo um mata-borrão na saudade enquanto escrevo com a minha Bic azul estas mal traçadas linhas que, certamente, seriam bem melhores se redigidas com uma autêntica e poderosa Parker 51.



   
        Neumar Monteiro. Aluna e Professora do Colégio Rio Branco.                          Foto: Cris Izidoro / Diadorim Ideias


A poetisa Neumar Monteiro da Silveira, autora de Devaneios (2003) e Sempre a Primavera (2011) herdou o gosto pela literatura, e em especial pela poesia, de seu pai, o poeta parnasiano Athos Fernandes.
Filha mais nova, ela acompanhava o pai a todos os compromissos, principalmente aos relacionados à literatura. Desde sempre, ela escreve onde estiver, em qualquer papel. "A inspiração vem do nada e, ao mesmo tempo, de tudo o que está à minha volta. A emoção pode brotar de um simples olhar, até mesmo de um animal", conta. 
A poesia de Neumar fala sobre as agruras da vida, os sonhos irrealizados e as recordações do tempo de criança. A mais recente obra foi um desafio: escrever e ilustrar o haicai Sempre a Primavera. Neumar buscou na arte milenar japonesa a inspiração para compor 63 pequenos poemas, todos em três versos, que falam de gestos, astros, pássaros, caminhos, sonhos e esperanças. 


Texto reproduzido do facebook da autora:

Um comentário:

  1. Mais uma homenagem feita a Neumar, hoje infelizmente ela não pode participar mas fiquem certos que nós da família nos orgulhamos do dia a dia. Ela sempre se preocupou em fazer cultura voltada para Bom Jesus. Muito obrigado pela gentileza.

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